BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O acordo entre a Petrobras e a União para pôr fim a disputas judiciais bilionárias pode render uma arrecadação menor do que o esperado inicialmente pelo Ministério da Fazenda.

Segundo interlocutores do governo ouvidos pela reportagem, o valor pode ficar entre R$ 12 bilhões e R$ 15 bilhões. A previsão inicial era receber cerca de R$ 20 bilhões.

O montante era tido como factível em termos brutos, mas não considerava fatores como a existência de garantias pagas pela Petrobras nos últimos anos e que já entraram no caixa do Tesouro.

Além disso, se a companhia optar pelo parcelamento da dívida, como permitido no âmbito do acordo, o valor a ser recebido em 2024 será ainda menor.

As receitas da transação com a Petrobras são uma fonte importante de recursos para o governo reforçar o caixa neste ano e buscar o cumprimento da meta fiscal de déficit zero.

Entre 2020 e 2022, a Petrobras firmou dois termos de “negócio jurídico-processual” com a PGFN (Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional), uma espécie de acordo guarda-chuva para uma série de processos de execução fiscal relacionados a débitos da companhia com a União.

O objetivo era viabilizar garantias suficientes para as dívidas, que somavam dezenas de bilhões, e afastar o risco de a empresa ficar com o nome sujo (sem certidão de regularidade) mesmo que por um único dia, o que já teria impacto negativo sobre inúmeros contratos internacionais.

Os acordos previam uma parte da garantia em capacidade de extração de óleo bruto dos campos de petróleo, um ativo relevante da Petrobras. Porém, como esse potencial não é imediatamente conversível em moeda, o trato previa também a substituição gradual dessa garantia por parcelas em dinheiro.

Segundo integrantes do governo, uma parte das garantias foi paga justamente no âmbito da disputa envolvendo a cobrança de tributos sobre remessas ao exterior nos contratos de afretamento de plataformas —que será alvo da negociação entre Petrobras e União.

Dos quase R$ 60 bilhões devidos pela companhia nesse tema, cerca de R$ 10 bilhões a R$ 12 bilhões já foram depositados em dinheiro como garantia, conforme previsto no acordo guarda-chuva.

O dinheiro entrou no caixa do Tesouro, em mecanismo semelhante aos dos depósitos judiciais em ações envolvendo a União, e ajudou no resultado primário de anos anteriores. Agora, esse valor precisará ser descontado na transação.

O edital de conciliação a ser publicado pela PGFN vai prever que o depósito será abatido do valor da dívida antes da aplicação dos descontos previstos na negociação. Como consequência, o montante que a União vai receber agora será menor.

Os contribuintes queriam ordem inversa, que os descontos fossem concedidos sobre o valor bruto da dívida e só então houvesse o encontro de contas com as garantias. O modelo foi rejeitado pela União porque daria uma diferença de bilhões e, em alguns casos, obrigaria o governo a até mesmo pagar de volta valores às empresas.

Embora outras companhias do setor também tenham dívidas relacionadas a esse tema, a estatal brasileira é a principal figura que poderá aderir ao edital a ser lançado pelo Ministério da Fazenda. Qualquer mudança nas perspectivas do acordo com a Petrobras tem impacto relevante sobre o potencial de arrecadação do governo.

Há ainda outro ponto que pode afetar as perspectivas de arrecadação da Fazenda. O edital prevê a possibilidade de parcelar o débito —quanto maior o número de prestações, menor o desconto concedido. Isso pode adiar o ingresso de parte dos recursos para os próximos anos.

A empresa também poderá pagar até 10% do saldo devedor com créditos de prejuízo fiscal, o que significa, na prática, um valor que nem sequer será arrecadado pelo governo.

O acordo ainda depende do interesse da Petrobras em aderir. A negociação precisa passar por um processo complexo de governança dentro da companhia, o que inclui aprovação dos minoritários. Mas, como o desconto da dívida é considerado muito atrativo, e a expectativa no Ministério da Fazenda e no Palácio do Planalto é de que a empresa vai aceitar.

A Petrobras acumula derrotas em discussões sobre a questão do afretamento na esfera administrativa —delegacias da Receita e Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais)—, mas já obteve vitórias no Judiciário.

No balanço de 2023, a empresa afirmou o valor de R$ 55,23 bilhões referentes a essa questão.

A companhia divulgou em 8 de abril um comunicado ao mercado dizendo que avaliava tecnicamente a minuta do edital de conciliação colocada em consulta pública.

A empresa afirma ainda que eventuais decisões relativas à adesão ou não da transação tributária seguirão “análises técnicas criteriosas”. “Fatos julgados relevantes serão tempestivamente divulgados ao mercado”, diz.

No total, a Petrobras possui cobranças tributárias no valor de R$ 180 bilhões, envolvendo União, estados e municípios, em processos judiciais, administrativos e arbitrais, que não estão provisionados.

Esses são os casos em que a perda é classificada como não provável ou para os quais não é possível fazer uma estimativa suficientemente confiável do valor da obrigação, por exemplo.

O Ministério da Fazenda prevê uma arrecadação de R$ 43,2 bilhões neste ano com acordos de transação tributária envolvendo diversas modalidades de negociação.