SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A ação que discute a revisão da vida toda está pronta para ser julgada no plenário físico do STF (Supremo Tribunal Federal), mas a decisão final ficará apenas para 2024, assim como deve ocorrer com outros temas previdenciários em análise na corte.

O motivo é o recesso do Judiciário, que começa nesta quarta-feira (20) e vai o final de janeiro, com a retomada dos julgamentos em fevereiro. A reportagem consultou advogados e levantou os cinco processos que envolvem o INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) mais importantes no Supremo.

A corte começará o ano com nova composição, ao incluir o ministro da Justiça, Flávio Dino, como um de seus integrantes, o que pode trazer reviravoltas e mais espera em processos já em andamento. O motivo é que novos ministros costumam pedir vista —tempo maior— para analisar temas complexos.

Além da revisão da vida toda, que discute o direito de o segurado do INSS incluir no cálculo da aposentadoria os salários mais antigos, há questionamentos sobre as mudanças na aposentadoria especial feitas na reforma da Previdência, a exclusão de menores sob guarda no direito à pensão por morte, o reconhecimento da aposentadoria especial do vigilante e a alta programada para quem solicita o auxílio-doença.

Para Roberto de Carvalho Santos, presidente do Ieprev (Instituto de Estudos Previdenciários), as ações mais importantes no Supremo no que diz respeito ao direito previdenciário são a da revisão da vida toda e a que discute as regras da aposentadoria especial após a reforma de 2019.

“A revisão da vida toda é uma tese que trata sobre o princípio da aplicação da regra mais favorável [ao segurado]. Ela traz uma interpretação, de algo muito acolhido no direito previdenciário, que é a possibilidade de se aplicar a regra melhor”, diz.

“Se essa tese morrer por questões econômicas, vai ser um retrocesso do direito previdenciário”, afirma Santos.

A advogada Adriane Bramante, presidente do IBDP (Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário), diz que a revisão da vida toda é uma ação que já está pronta para ir a julgamento e, por isso, pode ser uma das primeiras analisadas na volta do recesso do Judiciário.

O processo será julgado no plenário físico, após o ministro relator, Alexandre de Moraes, solicitar destaque durante o julgamento dos embargos de declaração no plenário virtual, no início de dezembro.

“A revisão da vida toda já está pronta para retornar a julgamento. O ministro Alexandre de Moraes já mandou pautar e ela deve entrar nos primeiros meses do ano após o recesso”, diz Adriane.

A expectativa dos advogados para essa questão é que a tese defendida por Cristiano Zanin, que pode devolver a ação ao STJ (Superior Tribunal de Justiça), não seja acolhida. “Seria um retrocesso. Aguardamos que as questões de ordem apresentadas sejam acolhidas”, afirma a especialista sobre recursos dos envolvidos na ação.

O advogado Fernando Gonçalves Dias, do Gonçalves Dias Sociedade de Advogados, também elege como um dos temas mais esperados na área previdenciária a ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) que discute as alterações feitas na aposentadoria especial após a reforma da Previdência.

Para os especialistas, as mudanças nas regras podem extinguir esse benefício. “Foram três as mudanças que prejudicaram muito quem tem direito à aposentadoria especial: exigência de idade mínima, proibição de converter tempo especial em comum e redução de 40% no valor dessa aposentadoria”, diz.

Rômulo Saraiva, advogado previdenciário, destaca o processo que discute a aposentadoria de vigilantes como um dos principais na área, cuja expectativa é chegar a um desfecho ainda em 2024.

A tese é para que se reconheça a atividade de vigilante como especial, com base no fundamento de que há exposição ao perigo, como ocorre, por exemplo, com policiais.

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VEJA AS PRINCIPAIS AÇÕES DO INSS EM DEBATE NO SUPREMO

REVISÃO DA VIDA TODA

O tema 1.102 chegou ao STF em 2020, após ser julgado procedente no STJ no ano anterior. A revisão foi aprovada no plenário físico do Supremo em dezembro de 2022, mas voltou a ser debatida neste ano, no plenário virtual, após embargos de declaração da AGU (Advocacia-Geral da União), que representa o INSS na Justiça.

A ação, que tem repercussão geral e valerá para todos os casos do tipo no país, vive uma reviravolta, após o ministro Zanin defender o retorno do caso ao Tribunal Superior. Segundo ele, que acolheu parte dos argumentos da AGU, a corte não teria seguido regras da Constituição ao analisar o direito.

A revisão da vida toda é um processo judicial no qual os aposentados do INSS pedem para incluir no cálculo da aposentadoria salários antigos, antes do plano Real, pagos em outras moedas.

Tem direito à correção o segurado que se aposentou nos últimos dez anos, desde que seja com as regras anteriores à reforma da Previdência, instituída pela emenda 103, em 13 de novembro de 2019. É preciso, ainda, que o benefício tenha sido concedido com base nas regras da lei 9.876, de 1999.

O motivo pelo qual se discute o direito é que a reforma da Previdência de 1999, realizada no governo Fernando Henrique Cardoso, alterou o cálculo da média salarial dos segurados do INSS, garantindo aos novos contribuintes regras melhores do que para os que já estavam pagando o INSS.

A tese aprovada em 2022 diz que “o segurado que implementou as condições para o benefício previdenciário após a vigência da Lei 9.876, de 26.11.1999, e antes da vigência das novas regras constitucionais, introduzidas pela EC 103/2019, tem o direito de optar pela regra definitiva, caso esta lhe seja mais favorável”.

DIREITO À PENSÃO POR MORTE DO MENOR SOB GUARDA

O tema 1.271 ganhou repercussão geral neste ano, após julgamento do STF. Com isso, a decisão a ser tomada vai ser utilizada em todas as ações do tipo no país. O processo discute se a exclusão do menor sob guarda do rol de dependentes da Previdência para pagamento da pensão por morte é constitucional ou não.

A exclusão foi feita na reforma da Previdência. Para Roberto de Carvalho Santos, do Ieprev, mesmo a regra tendo sido colocada na Constituição, pode ser definida como inconstitucional pelo Supremo.

“O que vamos ver agora é se a exclusão fere as cláusulas pétreas da Constituição, como a questão da dignidade da pessoa humana”, diz ele.

O caso que chegou à corte é de um menor de oito anos, criado pelo avô desde os cinco porque a mãe estava presa e o pai o abandonou. A criança dependia financeiramente do avô, que não tinha sua tutela, mas detinha a guarda como responsável.

O avô morreu no dia 22 de fevereiro de 2021, depois, portanto, da reforma. No INSS, o pedido de pensão foi negado.

MUDANÇAS NA APOSENTADORIA ESPECIAL

As alterações da reforma da Previdência na aposentadoria especial estão sendo debatidas na ADI 6.309. A ação integra um lote de processos levados ao STF após as mudanças no INSS, que pedem a inconstitucionalidade de parte das novas normas.

O primeiro caso sobre a reforma da Previdência já foi julgado neste ano e trouxe resposta negativa ao pedido dos segurados. Os ministros entenderam que o cálculo da pensão por morte, que reduz em 40% o benefício, é constitucional.

A ADI 6.309 questiona a exigência da idade mínima na aposentadoria especial, o fim da possibilidade de conversão do tempo especial em comum e a mudança na regra do cálculo do benefício. O julgamento deverá recomeçar do zero no plenário físico após pedido de destaque do ministro Dias Toffoli.

RECONHECIMENTO DA ATIVIDADE DE VIGILANTE COMO ESPECIAL

O STF vai julgar como repercussão geral o tema 1.209, que trata sobre o direito de vigias e vigilantes à aposentadoria especial do INSS, que garante o benefício com menos tempo de trabalho. O caso chegou ao Supremo em 2022, após ser julgado procedente no STJ.

Na ocasião, o Tribunal Superior reconheceu o direito à aposentadoria especial da categoria, inclusive no caso de vigilantes que não portam arma de fogo no exercício da sua função. A forma de provar a atividade de risco é por laudo ou formulário padronizado pelo INSS, como o PPP (Perfil Profissiográfico Previdenciário).

Além disso, o STJ definiu que o tempo especial pode ser comprovado por meio de outras provas, como similaridade com laudo de outro colega.

No STF, os ministros devem decidir se há o direito ao benefício especial mesmo após a reforma da Previdência de 2019, que define como atividade especial apenas as que estão expostas a agentes químicos, físicos e biológicos.

Para o INSS, a periculosidade não entra nesta regra, garantindo apenas o adicional durante o tempo de exercício da função.

ALTA PROGRAMADA NOS PEDIDOS DE AUXÍLIO-DOENÇA

A alta programada do segurado que fica temporariamente incapacitado para o trabalho recebendo auxílio-doença do INSS passou a valer em 2017, como uma das medidas do governo de Michel Temer no controle aos gastos com benefícios por incapacidade.

Pela lei 13.457, caso o médico do segurado doente não tenha indicado a data da alta, o perito do INSS deve fixar prazo de alta programada, de até 120 dias.

O advogado Roberto de Carvalho Santos explica que essa volta ao trabalho com data marcada pode ser prejudicial ao segurado quando há evolução no quadro clínico da doença para pior, levando-o a precisar de mais tempo de afastamento.

A regra está sendo debatida no tema 1.196, de repercussão geral.

Atualmente, com o Atestmed, cujo pedido de auxílio é feito pela internet, com a realização da perícia médica a distância, apenas com análise do atestado, a previsão de alta deve constar no atestado. E, caso o segurado não está recuperado na data prevista de volta ao trabalho, pode pedir a prorrogação do auxílio-doença em até 15 dias antes do retorno.

“O que acontece, muitas vezes, é que as doenças evoluem de uma forma totalmente diferente daquilo que foi estimado pelo profissional da saúde”, diz Santos.