SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Após a Justiça anular os efeitos da votação que aprovou a adesão da capital paulista à Sabesp nas mãos da iniciativa privada, vereadores que apoiam a venda da companhia de saneamento esperam que a Câmara recorra da decisão. Já a oposição comemorou a medida.

Nesta sexta-feira (3) a juíza Celina Kiyomi Toyoshima, da 4ª Vara de Fazenda Pública da Justiça de São Paulo, anulou a votação da Câmara -a informação foi adiantada pela coluna Painel. Ela afirma que o Legislativo paulistano descumpriu determinação anterior de votar o projeto somente após a realização de todas as audiências públicas e depois de apresentar um estudo de impacto orçamentário.

A presidência da Câmara, comandada por Milton Leite (União Brasil), afirmou que houve “interferência judicial”. Segundo ele, o rito legislativo foi cumprido e a votação ocorreu após a realização de nove audiências públicas agendadas e a apresentação de um estudo de impacto orçamentário. A Procuradoria da Câmara avalia recorrer da decisão.

A Câmara Municipal aprovou na quinta-feira (2) projeto de lei que autoriza a capital paulista a firmar contrato com a Sabesp (Companhia de Saneamento Básico de SP) após a privatização. O texto foi sancionado por Nunes logo depois.

O texto foi aprovado com 37 votos a favor e 17 contrários -o vereador Adilson Amadeu (União Brasil) não votou.

O vereador Rubinho Nunes (União Brasil), defensor da privatização, diz que o PT e o PSOL “induziram maliciosamente a juíza a erro” -a decisão anterior que a juíza afirma ter sido descumprida, de 24 de abril, se deu após ação apresentada pelas bancadas do PSOL e do PT.

Rubinho afirma que a Câmara já esgotou o número de audiências públicas e que a Casa apresentou estudo indicando que não haveria impacto na receita com a privatização da empresa.

“A Câmara respeita a decisão da juíza e de todos os magistrados, mas, respeitosamente, vai recorrer ao Tribunal de Justiça e esclarecer os argumentos mentirosos trazidos pela oposição. Tenho certeza que essa decisão vai ser revertida em questão de horas ou poucos dias”, diz Nunes.

Outro defensor da concessão, o vereador Sidney Cruz (Solidariedade) também afirma que a decisão anterior do Tribunal de Justiça havia sido cumprida.

“Acho que está havendo um equívoco. Porém é uma decisão judicial, tem que ser cumprida, e a única forma de reverter essa decisão é por meio de um recurso do Tribunal de Justiça”, afirma.

A vereadora Silvia da Bancada Feminista (PSOL), por outro lado, comemorou a decisão da Justiça. Segundo ela, a votação foi ilegal.

“Era uma votação ilegal porque não cumpriu os requisitos determinados pela própria juíza, dizendo que o substitutivo deveria ter divulgação e não teve, assim como as audiências públicas e o estudo sobre impacto financeiro. O que a prefeitura apresentou foi uma opinião, não um estudo”, disse a vereadora.

Procurada pela reportagem, a prefeitura de São Paulo defendeu a votação que aprovou a privatização da companhia.

“A Prefeitura da Cidade de São Paulo defende que a vontade soberana dos vereadores, expressa pela votação que aprovou por ampla maioria o projeto que autoriza a privatização da Sabesp, prevaleça, visto que todos os fundamentos constitucionais foram cumpridos”, afirmou em nota.

Já a gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos) disse, em nota, que a decisão não interfere no andamento do processo de desestatização da Sabesp.

“A decisão da Justiça Paulista sobre a votação do projeto de lei 163/2024, que autoriza o prefeito de São Paulo a assinar um novo contrato de concessão da Sabesp, diz respeito a uma ação movida por vereadores contra a Câmara Municipal. Essa decisão não interfere no andamento do processo de desestatização, que é conduzido pelo Governo do Estado”, afirma, em nota.

A sessão realizada na quinta-feira foi marcada por protestos e contestação na Justiça. Isso porque, minutos após o início da discussão no plenário, a juíza Toyoshima emitiu uma decisão que causou polêmica entre os parlamentares.

Em sua manifestação, ela destacou que a votação na Câmara não poderia acontecer sem o cumprimento de obrigações judiciais recentes. No entanto, os efeitos dessa decisão deixaram dúvidas.

Para a oposição, a sessão deveria ser suspensa a partir da manifestação da magistrada. Já os vereadores favoráveis ao projeto argumentaram que a decisão do TJSP não suspendia a sessão.

“A Justiça, em momento algum, suspendeu a votação […]. A liminar dela preconizava que nós deveríamos ofertar a ela o impacto orçamentário, e o mesmo se encontra nos autos no processo dela”, disse o presidente da Câmara, Milton Leite, à imprensa, após a votação.

No fim da tarde, o Ministério Público de São Paulo chegou a se manifestar dizendo que a decisão do TJSP significava que a votação do projeto estava suspensa.

O órgão pede à Justiça que dê à Câmara Municipal 48 horas para apresentar análises técnicas sobre o estudo de impacto divulgado pela prefeitura. A Procuradoria também pede para que a Câmara “comprove que os estudos técnicos foram amplamente discutidos nas audiências públicas realizadas nos últimos dias”.

A Defensoria Pública de São Paulo também se manifestou favorável à suspensão.

A votação de quinta-feira revoga os artigos de uma lei municipal de 2009 que estabeleciam que o contrato entre a prefeitura e a Sabesp seria extinto caso o controle acionário da companhia fosse transferido à iniciativa privada.

A autorização para a desestatização da companhia já foi concedida pela Alesp (Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo) no final do ano passado. Agora, os vereadores da capital paulista aprovaram que a empresa continue operando na cidade –caso não alterassem a lei, o leilão de ações previsto para o meio do ano perderia atratividade, o que dificultaria o processo.

Sozinha, a capital responde por 45% do faturamento da Sabesp. Ou seja, se a maior fonte de receita ficasse fora do pacote, o valor de venda seria reduzido drasticamente.

Os vereadores decidiram ampliar os ganhos que a capital terá com o novo contrato no projeto votado nesta quinta. O texto propõe alteração de 13% para 25% a parte da receita bruta da empresa que deve ser destinada a investimentos na capital até 2029. O texto aprovado em 1º turno fixava a alíquota de 20%. A partir da próxima década, porém, o valor deve voltar a ser de 13%.

Os vereadores favoráveis à privatização também fecharam acordo para que a Sabesp antecipe 5,5% da receita bruta destinada ao Fundo Municipal de Saneamento Ambiental e Infraestrutura para o período de 2025 a 2029. O projeto aprovado em abril prevê antecipação de 3%.

O Governo de São Paulo detém hoje 50,3% das ações da empresa e pode vender até 30% do total, segundo o projeto aprovado pelo Legislativo estadual.

A concessão prevê investimentos na ordem dos R$ 68 bilhões em saneamento básico nos próximos cinco anos, dentre os R$ 260 bilhões previstos até 2060, segundo a gestão Tarcísio.

O montante seria necessário para a universalização do saneamento básico até 2029, na versão do governo, com um mínimo de 99% da população com acesso a água potável e 90% a coleta e tratamento de esgoto, como prevê o Novo Marco do Saneamento.

O governo prometeu também um desconto de até 10% na tarifa social de água, destinada a população mais vulnerável.

RAIO-X DA SABESP

Fundação: 1973

Lucro líquido em 2023: R$ 3,5 bilhões

Valor de mercado: R$ 57 bilhões

Funcionários: 11.170

Municípios atendidos: 375

População atendida: 28,4 milhões