Mesmo com a criação de um conjunto de leis de amparo, mães de crianças com deficiência seguem enfrentando um cotidiano de dificuldades para a garantia de direitos quando se trata da falta de auxílio do Estado, pouco apoio e despreparo dos equipamentos públicos.

Em busca de esclarecimentos e respostas à respeito da falta de distribuição de fraldas e medicamentos por parte da Central de Medicamentos do Amazonas (CEMA), mães de crianças com deficiência se reuniram e manifestaram na porta da sede do Governo do Estado onde, sem diálogo, foram recebidas pela polícia.

Ao portal Amazônia Press, a defensora pública Carol Braz declarou estar indignada com a situação e frisou que essas mães utilizam a Cema para obtenção de fraldas, medicamentos e nutrição especial, e estão sem esses itens há algum tempo. De acordo com ela, elas não foram ouvidas pelo órgão estadual.

“Completamente revoltante. São mulheres fragilizadas, que vivem passando por muita necessidade. Serem recebidas pela polícia é covardia.

Em um vídeo publicado por meio das redes sociais, Carol relatou o ocorrido.

https://www.instagram.com/reel/C6AF8nEAbTa/?igsh=OGs1ZjhyN3l5cXZt

“Eu sou mãe, eu sou mulher e não admito esse tratamento com mães que estão exigindo nada além do seu direito. Elas estão exigindo fraldas, medicamentos e que os seus filhos sejam tratados com dignidade”, declarou.

Em entrevista ao portal Amazônia Press, a presidente da Associação Mais Fé, que atua prestando assistência para crianças com microcefalia congênita do zika vírus e que estava à frente da manifestação, Romilda Marques dos Santos contou em detalhes sobre a abordagem em frente à sede do Governo.

De acordo com Romilda, o grupo já havia se reunido em frente à sede da Cema, mas não obteve retorno algum.


“Quando começamos a fazer a manifestação lá na sede do Governo, logo de início começou a chegar muita muita polícia. O Major André se apresentou e perguntou porque estávamos ali e falamos sobre a causa, que era por conta da falta de insumos, fraldas, medicamentos que os nossos filhos dependiam. Então ele falou que ia chamar alguém para nos atender, mas isso não aconteceu. Ficamos lá por quase cinco horas e nada foi resolvido. No decorrer disso, ele já irritado por conta que estava demorando muito, ele pediu para a gente se retirar, só que negamos e falamos que ficaríamos no local até que alguém nos atendesse e nos desse uma resposta”, disse.

Complementou: “Ele falou que não adiantava a gente estar ali e assim foi ficando irritado. Começou a chamar mais polícia, o conselho tutelar… sempre muito alterado com as mães e gritando em cima das mães. Foi quando ele viu que tinha um um homem ali nos acompanhando, já que geralmente só vai a gente mulher, e foi para cima dele e disse que a próxima vez que o visse ali, ele seria preso. Teve uma mãe que se meteu na frente e achou melhor ele ir embora. Nessa hora, o major puxou o braço da mãe e começou toda uma agressão ali”.

No momento do ocorrido, Romilda alegou que o major continuou perseguindo o tio da criança que estava no local até a porta de uma escola que fica na localidade.

“Foi quando a diretora dessa escola o colocou para dentro e disse que toda vez que tem alguma manifestação eles agridem alguém. Ele disse que até na porta da escola os PM’s foram atrás dele. Com o intuito de nos tirar dali, um dos policiais ainda puxou uma mãe que estava ali e aí começa outra agressão ali. O major chegou a dar voz de prisão para a gente alegando que estávamos fazendo arruaça. Depois de termos passado por tudo isso, ninguém deu uma resposta para nós e a Cema continua sem qualquer tipo de alimento, fralda descartável ou insumo para as crianças. Recentemente demos uma entrevista e deram a resposta dizendo que lá na Cema não estava faltando nada e é mentira, está faltando tudo. Agora que está faltando mesmo e até agora nós não recebemos nenhuma resposta se quer. Fora que o psicológico das mães tá abalado, foi muito muito foi horrível o que aconteceu ali”, frisou.

Mãe do pequeno Emanuel, de 4 anos – diagnosticado com microcefalia e Síndrome de Lennox Gastaut – Rairane Barbosa, também estava presente no momento da manifestação e declarou ao portal de notícias que se sentiu coagida e agredida ao ser recebida pela polícia na ocasião.

“Não estávamos ali com a intenção de difamar a imagem ou destruir algo, mas só apenas reivindicar os direitos dos nossos filhos. Por ter sido recebida pela polícia, pela guarda do palácio, eu, como cidadã de bem que eu sou, me senti muito muito mal psicologicamente pela situação de ver uma amiga ser empurrada e com eles pedindo para nós nos retirarmos do local com ameaças de ser de ser presa se não saíssemos. Me senti muito, muito agredida”, disse.

Mãe da jovem Henely Marques, de 18 anos, – diagnosticada com paralisia cerebral e Síndrome de Rett -, Francisca Marques, ressaltou que o grupo foi para uma manifestação pacífica e frisou que se sentiu muito humilhada por serem recebidas pela polícia.

“Nossa manifestação era para ter uma resposta dos insumos que está faltando na Cema. Lá não tem nada, não tem nenhum tipo de alimentação para os nossos filhos, nós precisamos muito dessa alimentação e fomos atendidas pelos policiais… teve mãezinha que foi empurrada, ameaçaram prender outras pessoas lá e estávamos lá apenas em busca de respostas nós queríamos uma resposta sobre alimentação dos nossos filhos que não tem na Cema. Não temos nem previsão de quando vai chegar essa alimentação e não tem nenhum insumo que os nossos filhos precisam. Nós fomos tratadas como bichos, como marginais e nós só queremos o direito dos nossos filhos. Não tinha necessidade de ter isso. Queremos respostas e alimentação para os nossos filhos. Tem vários PCD’s que se alimentam pela gastrostomia que estão passando por necessidades. Uma mãe está ajudando a outra com alimentação porque não tem”, ressaltou.

“Estávamos apenas exigindo o direito dos nossos PCD’s, declarou Francimara Oliveira. Mãe de Lincoln, de 17 anos – diagnosticado com Síndrome Lennox Gastaut, Francimara declarou que o seu filho é traqueostomizado, 100% acamado e dependente de ventilação mecânica por 24h, ressaltou as dificuldades enfrentadas pela constante falta de insumos oferecidos pela Cema e sobre a suposta represália sofrida por parte dos policiais.

“Não é justo sermos humilhados por policiais que estavam ali na frente da sede do governo tentando fazer com que saíssemos dali e nos calássemos. Agora chegou o momento de não nos calarmos mais. É hora da população olhar para esse público não com um olhar de pena ou de dó, mas de respeito e entender que essas pessoas têm mães, mães que dão sua cara a tapa pelos direitos dos seus filhos, mães estas que lutam constantemente por esses direitos, mães que não vão permitir que seja lá quem for venha tentar inibi-las, mães que estão prontas pra guerra, mães que estão acostumada a passar noites em claro e no dia seguinte precisam estar ‘zero bala’ para enfrentar o cotidiano e os desafios da vida. Enfatizando outro detalhe, as mães que são, em grande maioria, mães solos. Mães que são pais também, que somente elas podem tentar resolver e buscar os direitos dos seus filhos”, destacou.

Tentamos contato com a assessoria da Secretaria de Estado de Saúde, em busca de esclarecimentos sobre o abastecimento da Cema, e com a Polícia Militar do Amazonas (PMAM) acerca da suposta represália sofrida pelas mães mas, até o presente momento, não obtivemos respostas.