Durante muito tempo, tínhamos poucos conhecimentos sobre os saberes contidos em nossa floresta e quais compostos poderiam ser extraídos dela para o tratamento e cura de doenças que afetam as populações locais quanto todo mundo. Entre esses conhecimentos estão o óleo de Copaíba, Andiroba e muitos outros, que conhecemos graças às tradições passadas de geração em geração dos nossos antepassados.
A população indígena desempenha um papel fundamental na transmissão desses conhecimentos para as gerações futuras, que darão continuidade às práticas tradicionais transmitidas de pais para filhos nas diversas áreas do saber que são descobertas a cada dia, mas que muitas vezes não são valorizadas e reconhecidas por sua grande utilidade em todas as áreas de atuação.
Promover saúde e qualidade de vida é o que se alcança ao colocar em prática todas as formas de sabedoria transmitidas por meio dos remédios e plantas medicinais, que possuem um valor imenso para a sociedade como um todo e estabelecem uma conexão vital entre o ser humano e a natureza.
Esses conhecimentos tradicionais e indígenas estão sendo compartilhados com estudantes universitários das áreas de ciências e medicina, possibilitando que eles estabeleçam conexões e integrem esses conhecimentos com a medicina ocidental, que se baseia no uso de medicamentos químicos sintetizados para obter resultados imediatos. A transmissão dessas técnicas e práticas, especialmente de forma oral, é uma parte crucial desse processo.
Por esse motivo, fomos em busca de uma pessoa que possuísse conhecimento aprofundado para falar de forma clara sobre a relação entre o homem e a natureza. Encontramos o Cacique Francisco Uruma Kambeba, Agente Indígena de Saúde e Terapeuta Holístico, residente na Zona Rural de Manacapuru-AM, na Aldeia Tururukaruyka.
É de extrema importância que esses conhecimentos sejam transmitidos para as futuras gerações, especialmente diante das doenças emergentes ao longo do tempo e das descobertas de curas que são feitas por meio de estudos nas diversas espécies de plantas encontradas na região amazônica. “É exatamente isso que evita o desaparecimento do conhecimento, a continuação dessas tradições que vivemos, a passagem dos pais para os filhos. É importante afirmar a identidade indígena não apenas em palavras, mas vivenciando a parte que nos foi concedida, aprendendo a conviver”, afirma o Cacique Francisco.
As práticas seculares adquiridas por meio do convívio com parentes, pajés, caciques e sábios desempenharam um papel fundamental na vida de muitas pessoas, inclusive durante o auge da pandemia que assolou grande parte da sociedade brasileira. Com a ajuda da medicina tradicional, obtiveram-se resultados significativos. “Na nossa aldeia, tivemos apenas um óbito durante a pandemia. Compartilhamos o tratamento de doenças, combinando remédios industriais com os tradicionais, respeitando os limites de cada um. Inicialmente, buscamos tratamentos com remédios caseiros e, se não obtivermos resultados, optamos pelos medicamentos farmacêuticos”, destaca o líder da Aldeia Tururukaruyka.
A diferença entre cada tipo de remédio reside em sua composição, uma vez que cada um passa por processos diferentes e apresenta efeitos em prazos distintos. Enquanto um é derivado do ambiente local, o outro possui recursos científicos. “Cada organismo reage de maneira diferente. Há pessoas cujos corpos estão acostumados a remédios, sejam eles caseiros ou naturais. Na nossa aldeia, deixamos o remédio tradicional como último recurso, quando a pessoa não encontra mais tratamento. O remédio caseiro tem uma reação diferente quando entra em contato com o corpo, portanto, há uma grande diferença entre os remédios florestais e os medicamentos genéricos da indústria. A interação entre os produtos naturais e as pessoas é relativa”, explica o líder do povo Tururukaruyka.
As técnicas dos povos indígenas são características das comunidades não tecnológicas, que dependem diretamente dos recursos locais, e são transmitidas por meio de práticas e códigos culturais, especialmente de forma oral, ao longo das gerações. “Durante a pandemia, a comunidade aldeada dependeu muito dos chás caseiros e da limpeza hepática, que envolve a desintoxicação do corpo, do sangue e do fígado. São doenças para as quais buscamos tratamento com remédios industriais, mas utilizamos nossas técnicas tradicionais e conhecimentos naturais, que ainda são muito presentes em nossa comunidade”, ressalta Kambeba.
Diante dos inúmeros casos de desmatamento na Floresta Amazônica, que causam mudanças climáticas, é essencial preocupar-se com a diversidade de espécies de plantas nativas utilizadas para fins medicinais, além da falta de políticas públicas que afetem a perda dessas espécies. “Devemos preservar a nossa natureza, com seus bancos de mudas de plantas e bancos catalogados com os remédios que utilizamos. Temos um viveiro de mudas em nossa comunidade, com todas as espécies. Coletamos mudas nativas e as multiplicamos com cuidado, para que sirva de exemplo para outras comunidades e para o poder público, que pode criar projetos, planos e modelos, e mostrar às grandes instituições que na floresta há cura, há tratamento, há remédios, e que a devastação não pode acabar com tudo isso. Essa é a minha visão do trabalho da saúde indígena e de cura”, conclui o agente.
Nossa busca por conhecimento e aprofundamento sobre o tema não para por aqui. Na próxima etapa, iremos buscar o ponto de vista de um especialista farmacêutico, para enriquecer ainda mais nossa compreensão sobre a relação entre os conhecimentos tradicionais e a medicina ocidental.
Continuaremos a explorar esse fascinante universo da medicina ancestral e suas contribuições para a promoção da saúde. Fique atento às próximas matérias, nas quais iremos aprofundar nosso entendimento sobre os remédios naturais da Amazônia e sua importância na preservação da biodiversidade e na busca por soluções sustentáveis.
Acreditamos que ao unir diferentes perspectivas e compartilhar saberes, poderemos promover uma saúde mais abrangente e integrativa, valorizando as tradições ancestrais e a ciência moderna. A jornada continua e convidamos você a fazer parte dela.