SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Diante das metas para redução e neutralização de carbono estabelecidas por organizações internacionais, a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) e o Congresso Nacional se movimentam para decidir as regras que vão guiar as companhias aéreas pelos próximos anos e décadas.

Neste mês, a Anac prorrogou até o começo de janeiro a consulta pública sobre uma nova resolução do setor que vai exigir a compensação do dióxido de carbono emitido por companhias aéreas em voos internacionais.

Para cumprir a regra, as empresas terão de comprar créditos de carbono. A Anac prevê multa de R$ 50 por tonelada de gás carbônico não compensada.

Após receber contribuições da consulta pública, que ficará aberta até 10 de janeiro, e passar por outros processos, como a aprovação da diretoria da Anac, o regulamento entra em vigor ainda em 2024.

A compensação das emissões, porém, é esperada, somente, para 2027. Isso porque a medida faz parte dos esforços da Anac para se adequar ao Corsia (esquema de compensação e redução de carbono para a aviação internacional, na tradução), mecanismo aprovado pela Oaci (Organização da Aviação Civil Internacional) em 2016 e do qual o Brasil é signatário.

O acordo tem duas etapas. Na primeira, que vai até 2026, os países criam medidas, de forma voluntária, para mitigar as emissões de carbono. Depois, essas ações se tornarão obrigatórias para os signatários, com exceção de países muito pobres ou com baixo número de voos.

O Brasil não é voluntário na primeira fase do programa. Por isso, as rotas que envolvem o país só passam a fazer parte do escopo de compensação em 2027.

Em outra frente para reduzir as emissões de carbono, as empresas aéreas aguardam a votação do projeto de lei no Congresso Nacional que trata do uso de combustíveis sustentáveis. Neste mês, a Câmara aprovou a urgência do projeto.

Entre as medidas definidas pelo projeto está a criação do ProBioQAV (Programa Nacional de Combustível Sustentável de Aviação), que obriga as empresas aéreas a diminuir as emissões de gases do efeito estuda nos voos domésticos por meio do uso bioquerosene de aviação, também conhecido como SAF.

O projeto de lei, apresentado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), quer incentivar o uso do biocombustível criando um cronograma de redução gradual das emissões por companhias aéreas: em 2027, a meta é reduzir emissões em 1%; em 2037, chega a 10%.

Segundo estimativas da Anac, o setor aéreo emitiu, em 2022, cerca de 13,5 milhões de toneladas de gás carbônico, contando operações domésticas e internacionais (voos que têm o Brasil como destino ou origem).

O cálculo não considera voos de helicópteros, aeronaves militares e aviões movidos a gasolina de aviação.

O resultado representa um aumento de 38% na comparação com o ano anterior. No entanto, o valor ainda não alcançou o patamar de 2019, antes de o tráfego aéreo sofrer restrições por causa da pandemia, quando quase 16 milhões de toneladas de dióxido de carbono foram lançadas na atmosfera pelo setor.

A transição para o uso de combustíveis menos poluentes é uma das grandes questões do setor aéreo hoje. Segundo Filipe Alvarez, gerente de Sustentabilidade da Azul, embora seja tecnicamente viável, o SAF (combustível sustentável de aviação, que pode ser feito com etanol e sebo animal, por exemplo) ainda tem um obstáculo econômico.

“As perspectivas de preço são que o SAF vai ser, no Brasil, quase quatro vezes mais caro do que o combustível tradicional. Cerca de 45% do custo operacional das aéreas são gastos com combustível. Se a gente aumentar isso quatro vezes, inviabiliza o negócio”, diz Alvarez.

Na visão do executivo, saídas para baratear o combustível vão desde a redução de impostos sobre o SAF a mecanismos de financiamento, tanto para a produção como para a aquisição do combustível pelas companhias aéreas.

Se o SAF não for barateado, uma alternativa apontada por Alvarez para compensar as emissões e cumprir as metas estabelecidas pela Oaci será comprar créditos de carbono.

Por esse motivo, ele diz que o setor acompanha a tramitação do projeto de lei que regula a compra e venda de créditos de carbono no país. O texto tramita na Câmara dos Deputados.

De acordo com a Iata (Associação Internacional do Transporte Aéreo), em 2023 já foram produzidos 600 milhões de litros de SAF —o dobro do registrado no ano passado. Apesar disso, o volume representa, somente, 0,2% de todo o combustível usado pela aviação no mundo.

Gerente de assuntos externos e sustentabilidade da Iata para as Américas, Pedro de la Fuente afirma que o setor entrou em uma corrida para erradicar as emissões de gás carbônico. A entidade estabeleceu uma meta de zero emissão líquida do poluente até 2050.

Para 2024, a estimativa da Iata é que a produção mundial chegue a 1,87 bilhão de litros —equivalente a 0,53% do combustível necessário para a aviação.

Além do obstáculo com combustíveis menos poluentes, novas tecnologias para a redução das emissões ainda devem demorar para chegar ao mercado. É o caso de voos realizados com o uso de eletricidade.

Segundo La Fuente, esse tipo de tecnologia só deve entrar no mercado a partir de 2035 e não deve ser usada para rotas de longa distância.

“Estamos falando de voos com mais de 200 passageiros, que não poderão ser substituídos por causa da limitação desse tipo de tecnologia. Para aviões elétricos, por causa do peso da bateria, é necessário eliminar alguns assentos”, afirma.