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Estudo aponta que queimadas e incêndios florestais já tornam a qualidade do ar nociva aos moradores da região da Amazônia Legal e do Centro-Oeste em pelo menos metade dos dias do ano. Segundo os pesquisadores, esse tipo de poluição afeta cerca de 20 milhões de brasileiros ou 10% da população do País. Os dados utilizados foram obtidos do satélite do Centro Europeu de Previsões Meteorológicas de 2010 a 2019. O estudo foi realizado por pesquisadores da Universidade do Estado do Mato Grosso (Unemat), da Fundação Oswaldo Cruz do Piauí, da Universidade Federal da Bahia (UFBA) e da Universidade de São Paulo (USP).

Segundo Mariana Matera Veras, bióloga e chefe do Laboratório de Patologia Ambiental e Experimental (LIM05) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, essas queimadas acontecem algumas vezes por ano em períodos mais secos, mas estão se tornando cada vez mais frequentes. “O poluente que é tratado no estudo a gente chama de material particulado 2.5. O 2.5 se refere ao tamanho dessa partícula, então ela é muito pequenininha, capaz de entrar nos nossos pulmões e atravessar barreiras de proteção, cair na corrente sanguínea e fazer bastante mal para nossa saúde.” 

Essa poluição, por sinal, é diferente da observada nos centros urbanos, e a principal diferença é a concentração desse poluente particulado. “Quando você tem uma queimada, a concentração é extremamente alta e por consequência quando você inala esse ar, a quantidade desse material particulado é muito alta. O que é interessante deste estudo é que eles desenvolveram um indicador para se estimar a exposição dessas populações, porque nessas regiões nós não temos redes de monitoramento de qualidade do ar como na cidade de São Paulo”, explica Mariana. 

Riscos para a saúde

A pesquisa utilizou dados de monitoramento por satélite e também dados gerados pelo Sinan de pontos de queimadas nas regiões. A partir disso, se fez um modelo para estimar o número de dias no ano ou no mês em que a concentração desse poluente está acima de 15 microgramas por metro cúbico. A estimativa também busca datar os dias de poluição acima do recomendado pela OMS. 

A partir da coleta desses dados, se tem uma dimensão dos impactos diversos para a saúde dos que estão expostos a esse tipo de poluição. “Essas partículas [poluentes] são muito ricas em hidrocarbonetos policíclicos aromáticos. Entre esses compostos, alguns são carcinógenos já conhecidos, e um estudo do nosso laboratório avaliou o potencial carcinogênico desta partícula e descobriu que essas partículas geradas pela queima de floresta na Amazônia podem induzir mutações nas células que eventualmente podem levar ao câncer”, comenta a pesquisadora. 

Outros riscos são aqueles observados, por exemplo, no tabagismo e podem ser de longo prazo. “A exposição à poluição do ar faz um mal muito semelhante ao cigarro, só que ela age mais lentamente. Em termos de efeitos, vão ser os mesmos, principalmente no sistema respiratório e cardiovascular, mas existem outros quando a gente está falando desse volume de poluente muito alto, como irritação ocular, eczema e alergias respiratórias”.

Também é preciso pontuar que a saúde mental é afetada, explica Mariana: “O que muitas vezes nós nos esquecemos é um impacto na saúde mental de quem lida para extinguir esse fogo e das pessoas no entorno com o medo e o calor gerado pelas queimadas”.

*Esta matéria pertence ao Jornal USP.