SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Os políticos brasileiros raramente publicam fake news em suas contas nas redes sociais, mostra estudo recém-publicado. De cada 100 publicações feitas por 945 políticos entre janeiro de 2018 e dezembro de 2020 no X (antigo Twitter), Facebook e Instagram, apenas uma (1%) continha desinformação. As postagens com fake news, no entanto, geram muito mais engajamento —têm 10 vezes mais curtidas ou compartilhamentos do que os posts factualmente corretos.

Os dados constam do estudo “Detecting misinformation: Identifying false news spread by political leaders in the Global South” (Detectando desinformação: identificando notícias falsas disseminadas por líderes políticos no Sul Global), publicado no Journal of Quantitative Description: Digital Media.

“O resultado é contraintuitivo, porque a maioria das pessoas acha que os políticos disseminam muita desinformação”, diz uma das autoras do trabalho, Nara Pavão, professora de ciência política da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).

“Na realidade, o que eles mais compartilham não são informações propriamente falsas, são publicações enviesadas, hiperpartidárias”, segue ela. Outro dos seis autores do estudo é o cientista político Felipe Nunes, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

E que tipo de político mais compartilha informações falsas? Segundo o estudo, idade, gênero ou geografia não são determinantes —mas a coalizão partidária, sim.

Políticos que eram parte da aliança que elegeu Jair Bolsonaro (então no PSL, hoje no PL) em 2018 tinham 21% mais chance de fazer postagens falsas, e os que faziam parte da coalizão do candidato derrotado, Fernando Haddad (PT), tinham 10% mais probabilidade, na comparação com aqueles não alinhados a nenhum dos dois.

O estudo avaliou 4,03 milhões de postagens de 945 políticos. Apenas 421, cerca de 1%, continham informações falsas. Dentre os políticos, 15% fizeram ao menos uma publicação com fake news.

Os dados mostram também que os políticos são muito ativos nas redes sociais. Postam, em média, seis vezes por dia. O estudo analisou publicações do presidente, vice-presidente, ministros, governadores, vice-governadores, deputados federais, senadores e candidatos a prefeito em todas as capitais brasileiras em 2020.

Os pesquisadores usaram um método menos comum nas análises de desinformação. A maioria das pesquisas avalia os domínios (postagens com links para sites que são considerados desinformativos ou que têm muitas notícias classificadas como falsas por agências de checagem).

No estudo de Nara, foi considerado o conteúdo do texto, vídeo ou imagem. Segundo ela, o método de domínios não é adequado ao contexto brasileiro —75% das postagens feitas por políticos não tinham link ou referência para nenhum site ou notícia.

“No Brasil, a maioria dos posts são textos, imagens ou vídeos que circulam depois em grupos de WhatsApp e Telegram, e não publicações com links”, afirma a professora.

De acordo com os pesquisadores, o método dos domínios acaba superestimando a quantidade de fake news em circulação. “Essa abordagem acaba classificando como falsas várias publicações que não são inverídicas, são enviesadas ou hiperpartidárias”, diz a cientista política. “Isso não significa que sejam melhores, trata-se também de um problema de qualidade de informação, mas não são fake news.”

Segundo ela, o método superestima a ocorrência de fake news porque muitas vezes os sites linkados são desinformativos, mas não necessariamente tudo que está neles é falso, há muito conteúdo tendencioso.

Um exemplo citado no estudo é do deputado Filipe Barros (PL-PR), que publicou um vídeo com a legenda “Haddad o pai do kit gay e do bolsa crack”. Essa publicação é desinformativa, uma vez que nenhuma das duas coisas existe.

Já uma outra publicação classificada como fake news pelo método dos domínios era, na realidade, apenas partidária. O mesmo deputado postou uma notícia veiculada pelo site O Antagonista afirmando que uma juíza havia barrado a visita da ex-presidente Dilma Rousseff e de deputados ao presidente Lula (PT), então preso em Curitiba.

Segundo Nara, uma hipótese é que os políticos muitas vezes não cruzam a linha do factualmente incorreto pelo custo que isso pode ter —postagens removidas da rede social e repercussões negativas.

Para determinar quais posts eram falsos, os pesquisadores usaram inteligência artificial para identificar conteúdo semelhante a publicações consideradas falsas pelas seis principais agências de checagem (Boatos, E-farsas, Fato ou Fake, Lupa, Aos Fatos e Projeto Comprova). Depois, os materiais passaram por revisão humana, método mais trabalhoso e demorado do que o que analisa domínios.

A pesquisa foi financiada pela Meta e pela Fapemig.