SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A polícia da Nicarágua prendeu mais dois padres da Igreja Católica nesta quinta-feira (28), afirmam ativistas de direitos humanos e a mídia local, elevando para pelo menos seis o número de clérigos detidos esta semana, segundo a agência de notícias Reuters.

As prisões fazem parte da última ofensiva do ditador Daniel Ortega contra a Igreja, que se tornou antagonista do regime ao longo dos 16 anos que o líder rege o país centro-americano. O gabinete de imprensa da ditadura não respondeu imediatamente a um pedido de comentário da Reuters.

Pelo X, antigo Twitter, a advogada Martha Patricia Molina identificou os últimos líderes religiosos presos como Héctor Treminio e Carlos Avilés. Segundo o jornal Confidencial, dois dos clérigos detidos na última semana já foram libertados —Jader Guido e Óscar Escoto Salgado.

Áviles é o vigário-geral na Arquidiocese de Manágua, capital do país, enquanto Treminio é o tesoureiro na mesma divisão administrativa. Ambos são críticos notórios do regime de Ortega.

O primeiro, por exemplo, afirmou em uma entrevista em junho de 2022 que o povo da Nicarágua “quer que este governo vá embora”. Já o segundo disse em uma homilia de agosto de 2020 que os membros da família Ortega “são os maiores capitalistas” do país.

Na semana passada, a polícia já havia prendido o bispo Isidoro Mora, 53, da diocese de Siuna, e os seminaristas Alester Sáenz e Tony Palacios, que seguem detidos, segundo a mídia local. A agência de direitos humanos da ONU para a América Central e o Caribe condenou o “desaparecimento forçado” de Mora e a “nova onda de prisões de religiosos”. “Além de atacarem a liberdade pessoal dele, violaram o direito à liberdade religiosa, um pilar de qualquer Estado democrático”, afirmou a organização.

Mora é o segundo bispo da Nicarágua preso desde a detenção de Rolando Álvarez, 57, em agosto de 2022. Notório crítico do regime, Álvarez foi condenado a 26 anos de prisão no início deste ano por traição à pátria e propagação de notícias falsas —acusações usadas contra qualquer opositor que se notabilize no país.

Um dia antes de a sentença ser proferida, o bispo de Matagalpa se negou a embarcar em um avião com destino aos Estados Unidos, junto de 222 exilados políticos que, assim como ele, posteriormente perderam a sua cidadania.

Em outubro, Álvarez novamente preferiu permanecer na prisão a se exilar com outros 12 padres libertados e enviados a Roma após um acordo do regime com o Vaticano. Após a libertação de centenas de presos políticos no começo do ano, o bispo é o mais famoso crítico do regime ainda em cárcere e fonte de desgastes para a ditadura.

Muitos dos clérigos detidos recentemente foram presos porque ofereceram publicamente orações a Álvarez, de acordo com a mídia local. O regime, porém, não emitiu nenhuma declaração explicando os supostos crimes dos padres.

O bispo nicaraguense Silvio Baez, que vive exilado na Flórida desde 2019, pediu a libertação de seus colegas. “Peço a Deus que os proteja e que sejam libertados imediatamente”, escreveu, na quinta, em uma postagem no X.

A relação entre a Igreja e o regime se deteriorou acentuadamente nas manifestações de 2018, ponto de inflexão no autoritarismo do país. Na época, a instituição foi a mediadora do diálogo entre o líder e a oposição até a repressão a um protesto matar 15 pessoas e deixar mais de 200 feridas.

A Conferência Episcopal da Nicarágua considerou as mortes uma agressão sistemática e organizada e anunciou que não voltaria à mesa de diálogo para dar fim à crise enquanto a população continuasse sendo “reprimida e assassinada”. Até o fim daquele ciclo de protestos, ao menos 355 pessoas seriam mortas, segundo a CIDH (Comissão Interamericana de Direitos Humanos).

Religiosos passaram a sofrer com o fechamento de rádios católicas e o assédio policial em celebrações, além da prisão de sacerdotes. De acordo com a advogada Molina, desde então houve 740 ataques contra a Igreja e 176 padres e freiras foram expulsos da Nicarágua ou proibidos de entrar no país.