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Gás de cozinha
Reprodução: ACidade ON

Gás de cozinha

O aumento da inflação atingiu em cheio o orçamento do brasileiro e fez com que até despesas básicas, como luz, gás e telefone deixassem de ser pagas. Dados do Mapa da Inadimplência da Serasa mostram que o país fechou 2021 com 63,9 milhões de devedores, o que significa um aumento de 2,6 milhões em relação ao ano anterior.

As contas básicas já representam 23,9% das dívidas e só ficam atrás das despesas relacionadas a bancos e cartões de crédito (27,7%).

A falta de dinheiro no bolso não é um problema só das famílias. As concessionárias de energia, gás e telefone estão recorrendo a programas de renegociação de dívidas com descontos generosos para reduzir as perdas. Outra alternativa é investir em um arsenal de mecanismos de cobrança para agilizar e estimular a quitação de contas.

Orçamento apertado

País teve aumento de 2,6 milhões de inadimplentes entre dezembro de 2020 e o fim do ano passado.

O caso mais grave é o setor elétrico, um dos vilões da inflação em 2021, que ainda conta com sobretaxa de R$ 14,20 na conta a cada cem quilowatts-hora consumidos até abril. As distribuidoras avaliam que voltar ao patamar pré-pandemia só será factível em 2023. O percentual de calote médio, segundo as empresas, está em 7% a 7,5%, quase o dobro do registrado antes da pandemia.

A Light iniciou em outubro uma campanha com desconto de até 95% e parcelamento de até 24 meses. Até agora, 43 mil clientes aderiram. Para aumentar a adesão, a concessionária planeja prorrogar a ação até o fim do primeiro trimestre. Segundo Rodney Argolo, gerente de Cobrança da Light, o objetivo é tirar o cliente da inadimplência.

“O desconto médio ficou em 80% e fazemos o parcelamento no cartão de crédito. O aumento no valor da tarifa com a bandeira tarifária (de Escassez Hídrica) dificulta ainda mais porque aumenta o valor da conta em um momento em que o desemprego está alto”, disse Argolo.

Recuperação só em 2023

Na Light, a taxa de inadimplência está entre 7% e 7,5%, um patamar maior do que a faixa de 4,5% a 5% do período anterior à pandemia.

“Temos em 2022 um ano de pequena frustração. Não esperamos chegar ao nível de antes da pandemia. A meta é recuperar 70% da perda”, disse.

Para Izis Ferreira, economista da Confederação Nacional do Comércio (CNC), inflação e juros altos são os principais fatores que comprometem o orçamento, elevando o número de contas em atraso.

“As famílias de renda mais baixa são as que mais sofrem, principalmente com a inflação alta. Estar inadimplente com uma conta de consumo significa que a qualquer momento você pode ter o serviço cortado. Atrasar uma dessas contas é sinal de uma dificuldade maior.”

Izis ressalta que o primeiro trimestre tende a ser particularmente difícil em razão das despesas de início de ano, como IPTU, IPVA e compra de material escolar.

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Para a família da advogada Carolina Velasque Pinho, de 27 anos, de Campo Grande, em Mato Grosso do Sul, o baque das despesas de início de ano foi pesado. Após perder o pai, há pouco mais de uma semana, a família precisou recorrer aos parentes para quitar despesas básicas mensais.

A advogada já estava com o cartão de crédito estourado em razão das despesas com medicamentos para o pai, que tinha câncer. A mãe de Carolina chegou a fazer financiamento para pagar todas as contas.

“Água, luz, telefone, internet, gás, alimentação e farmácia… Tem de fazer milagre para manejar tudo. E ainda vai ter IPTU e IPVA, nem sei como vamos pagar”, disse Carolina.

As empresas incentivam a renegociação e investem em mecanismos de cobrança. A Energisa, com pouco mais de oito milhões de clientes, diz que o calote está em patamar “desafiador”. Ela manteve o foco em cobranças via SMS, protesto, e-mail, suspensão de fornecimento para clientes sem restrições, cobrança por WhatsApp, robô de telecobrança, além de pagamento e negociação com cartão de crédito e quitação de fatura por Pix com Qr Code.

‘Voltar à vida normal’

Na Neoenergia, com 15,6 milhões de clientes, a estratégia foi usar um aplicativo de renegociação. Já é o canal mais usado para regularizar contas. De maio a outubro, último dado disponível, foram R$ 23,6 milhões em débitos negociados. A empresa permite pagar via cartão de crédito em até 24 vezes, além do boleto. Somente no terceiro trimestre, foram 194 mil negociações.

Na Naturgy, que atende 74 municípios do Rio e de São Paulo, no fornecimento de gás há uma campanha de parcelamento que permite dividir em até 12 vezes com isenção de mora e multa. A negociação é feita em plataforma on-line.

A Companhia Paranaense de Gás (Compagás), que atende 51 mil clientes no estado, afirmou que nos últimos anos sofreu um aumento no nível de inadimplência em todos os segmentos que atende e estimula a renegociação. A opção de parcelamento da fatura tem sido a saída para parte dos clientes.

Nas teles, a inadimplência sobe em parte das empresas. Na TIM, a provisão para devedores duvidosos subiu 33% no terceiro trimestre de 2021 na comparação com igual período do ano anterior. A empresa criou a plataforma TIM negocia, permite pagamento por Pix e desbloqueio em cinco minutos no caso de quem já teve a linha cortada. E pagamento em até seis prestações.

Na Oi, ela subiu 6,9% entre julho e setembro. O maior impacto foi no varejo.

Os mutirões de renegociação de dívidas do Procon-RJ receberam mais do que o dobro de inscrições no ano passado frente a 2019, antes da pandemia: 12.192 contra 5.567.

“Muitas pessoas ficaram endividadas na pandemia e de forma tão severa que deixaram de pagar contas de luz, água e gás. Elas querem regularizar suas contas para voltar a viver uma vida normal”, afirmou Cássio Coelho, presidente do Procon-RJ.