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A seca severa em rios da Amazônia, com consequências mais danosas a cidades e comunidades no Amazonas, deu impulso político à pressão pela pavimentação da BR-319, que liga Manaus a Porto Velho. Os defensores da pavimentação argumentam que ela é necessária para a redução do isolamento de moradores dos dois estados conectados, Amazonas e Rondônia. Com a seca severa neste ano, a coação pela rodovia se ampliou, em razão das dificuldades de navegação no período de estiagem.

No entanto, segundo documentos do processo de licenciamento ambiental em curso no Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), a obra pode provocar mais grilagem de terras públicas no curso da rodovia, ampliar o desmatamento ilegal e impulsionar a exploração criminosa de madeira. Um fato é que a restauração e pavimentação da BR-319 foi, e continua sendo, tema de discussão que ultrapassa gestões públicas com implicações que vão além da mera pavimentação de uma estrada.

Alguns políticos amazonenses culpam a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva (Rede) pelo não asfaltamento da BR-319 e pelo isolamento da região sul do Estado em consequência da seca severa. Os dois problemas persistem há décadas e, no período, Marina foi ministra entre 1º de janeiro de 2003 a 13 de maio de 2008. E voltou a ocupar o cargo, em 1º de janeiro deste ano, quase 15 anos depois.

Foto: Divulgação/Observatório BR-319

De acordo com a economista Denise Kassama, a não existência da BR-319 não ocorre por conta da ministra Marina Silva, mas que é preciso lembrar dos 10 anos que de debate intensificado acerca de 10 anos

“O principal ainda não foi muito consolidado, que é o consórcio do processo de pavimentação. Não houve ainda o processo licitatório para que o trabalho comece a chegar nas vias de fato. É preciso lembrar também, por uma característica da região, que só é provável trabalhar durante seis meses do ano, visto que, quando as chuvas começam, o trecho já precisa estar consolidado. Quando falamos sobre uma obra que está no meio da Amazônia, é importante também nos aspectos econômicos, sociais e ambientais. Impactos ambientais já são comuns de qualquer forma, o que é preciso analisar é apenas é a dimensão desse impacto”, disse.

Denise ressalta ainda que a BR-319 é uma importante via de comercialização, principalmente, de Rondônia para o Amazonas, cujo fluxo é melhor para abastecer o mercado amazonense. Além disso, a economista também pontua a BR-319 como uma alternativa para driblar os prejuízos causados pela seca no Amazonas.

Empresários do setor do comércio e transporte fluvial de cargas estão enfrentando grandes preocupações devido à seca severa que atingiu uma marca histórica nesta segunda-feira (16). Essa situação tem gerado uma série de consequências negativas, incluindo possíveis problemas de desabastecimento e a queda na arrecadação do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).

Foto: divulgação

“Cabe lembrar que até o tambaqui que comemos nas nossas mesas vem, em sua maioria, de Rondônia. Existe uma produção rural muito expressiva, com banana e outros itens que abastecem o mercado de Manaus. Um dos principais meios ainda é o fluvial, mas a BR-319 ainda seria uma alternativa, ainda mais em um momento que o rio está com dificuldade de trafegabilidade”, disse a economista.

Com o objetivo principal de encontrar ações paliativas para minimizar os impactos da estiagem e sensibilizar as autoridades, a Fecomércio Amazonas realizou nesta segunda-feira uma reunião com representantes de portos, terminais e transporte intermodal para discutir a estiagem no Amazonas.

Os pontos apresentados como urgentes na reunião foram a dragagem da foz do Rio Madeira e a reconstrução da BR-319, rodovia que desempenha um papel vital na integração com o restante do Brasil, facilitando o transporte de mercadorias e pessoas, além de viabilizar o escoamento da produção agropecuária, industrial e comercial do Amazonas, conforme explica o presidente Aderson Frota.

“No momento em que a mercadoria, através do rodofluvial, precisa sair de Porto Velho, a embarcação não tem capacidade de navegação pelos bancos de areia e pela falta de dragagem que é fundamental neste momento. Durante a reunião, tivemos conhecimento que o DNIT já tem um programa aprovado para a realização dessa dragagem que precisa ser feita urgentemente”, explicou o presidente durante a reunião.

Em entrevista ao portal Amazônia Press, ele ressaltou que a logística no Estado do Amazonas é muito precária e que as únicas alternativas de transporte envolvem a cabotagem e o rodo fluvial, uma mistura de rodoviária em balsa navegando pelos rios.

“Isso é algo que acaba encarecendo os nossos custos pela escassez de modalidades. Nós não temos ferrovias, a nossa rodovia está intransitável há muitos anos e, pelo visto, teremos grandes dificuldades pela frente. Aguardamos há nos que realmente a nossa BR-319 seja recuperada. Dentro da nossa concepção e do entendimento de nós amazônidas, o que tinha de ter de dano ambiental já ocorreu. A estrada foi concluída no começo dos anos 70 e não faz sentido esse tipo de preocupação em relação às ameaças ao meio ambiente. Se nós tivemos a oportunidade de acrescentar mais um modal dentro da nossa logística de transporte, com certeza isso reduziria os custos de transporte. Nós temos uma complexidade muito grande, burocracia, os fretes mais elevados do Brasil e isso tudo acaba refletindo nos preços das mercadorias e do custo de vida da nossa região”, pontuou.

Complementou ainda: “A nossa expectativa é que a BR-319 não só seja recuperada, concluída efetivamente e acrescente mais uma modalidade para o sistema de transporte do nosso Estado e isso vai facilitar muito a movimentação da própria economia. Os nossos fretes são elevados, mas, quantos mais modalidades tivermos, mais ressignifica dizer que os preços serão mais competitivos e vamos ter a oportunidade de ter um transporte com menos custo, menos complexidade, alternativas mais viáveis e que contribui para o varejo comercial do nosso Estado”.

Ao portal Amazônia Press, o ambientalista Carlos Duringan declarou que as principais frentes de degradação na Amazônia estão relacionadas às estradas.

“A expansão da malha rodoviária na região iniciada há mais de 50 anos possibilitou o avanço da destruição de florestas e já perdemos mais de 20% da cobertura florestal. A repavimentação do trecho do meio da BR319 se não for acompanhada de um forte componente de fortalecimento da gestão e governança sobre a região do interflúvio dos rios Purus e Madeira, pode contribuir com uma forte escalada na degradação no coração da Amazônia, como já tem ocorrido na sua porçâo mais ao sul e mesmo na região metropolitana de Manaus, nos trechos onde a estrada já é pavimentada e onde se concentram grandes frentes de desmatamento e queimadas”, dissertou.

Na última sexta-feira, dia 13 de outubro, a ministra do Meio Ambiente, Meio Ambiente, Marina Silva, afirmou, nesta sexta-feira,13, que a atitude do presidente Lula foi corajosa ao dizer que a BR-319 “vai para estudos e não imediatamente para contratação do empreendimento”. O ambientalista Marcos Maurício classifica o proferido pela ministra como “falacioso”.

“Já tive oportunidade de me manifestar em outras ocasiões acerca desse posicionamento da ministra Marina Silva.  Em verdade, sobre a pauta da Rodovia BR-319, o posicionamento dela não me surpreende.  Porém, ao mencionar que a Rodovia BR-319 “vai para estudos” a ministra, intencionalmente, infirma o próprio Estudo de Impacto Ambiental, o qual já foi aprovado em julho de 2022. Está claro, na minha leitura, que a intenção é procrastinar, ganhar tempo. O Governo Federal, ao invés de construir narrativas para dificultar o avanço do processo de licenciamento ambiental do Trecho do Meio da Rodovia BR-319 (Kms 250,7 ao 656,4), deveria sim, estar atento ao Plano Básico Ambiental, cuja aprovação é condição para a expedição da Licença de Instalação”, analisa.

Além disso, ele também diz que o Governo Federal “rodeia” e “hesita” quando o assunto envolve o Estudo de Impacto Ambiental.

“E isso porque a viabilidade ambiental do empreendimento já foi reconhecida por ocasião da expedição da Licença Prévia, decorrente da aprovação do EIA. Revisitar o EIA, como já foi cogitado, trará desgaste político para o governo. Então, a forma que encontrou para travar o avanço desse processo é exatamente forçar que a BR-319 seja submetida a “novos estudos”. Está claro que o posicionamento da ministra Marina Silva não é técnico; se fosse, faria menção ao Estudo de Impacto Ambiental.

A questão está na perspectiva da política.  E é neste ponto que mais uma vez convido os parlamentares de toda a Amazônia Ocidental, juntamente com os Governadores, a se unirem efetivamente em defesa dessa pauta e utilizarem argumentos técnicos em defesa da repavimentação da BR-319. Para isso, temos o Estudo de Impacto Ambiental, repito, já aprovado”, finalizou.