Evangelho de São Lucas, capítulo 16, versículo 19 em diante:
“Havia um certo homem rico, que se vestia de púrpura e de linho finíssimo, e vivia todos os dias regalada e esplendidamente.
Havia também certo mendigo, chamado Lázaro, que jazia cheio de chagas à porta daquele, e desejava alimentar-se com as migalhas que caiam da mesa do rico. Os próprios cães vinham lamber-lhe as chagas
Morreu o mendigo e foi levado pelos anjos para o seio de Abraão. Morreu também o rico e foi sepultado.
No inferno, estando em tormentos, ergueu os olhos e viu ao longe a Abraão e Lázaro no seu seio.
Então clamou: Pai Abraão, tem misericórdia de mim, e manda a Lázaro que molhe na água a ponta do seu dedo e me refresque a língua, porque estou atormentado nesta chama.
Mas Abraão respondeu: Filho, lembra-te que recebestes os teus bens em tua vida, ao passo que Lázaro somente males, mas agora ele é consolado e tu atormentado”.
Antes de tecermos quaisquer comentários, precisamos deixar muito claro que esta passagem é uma parábola e como tal, a situação vivida é fictícia, os personagens são fictícios e qualquer exploração do texto que não seja didática, é , no mínimo perigosa e inconseqüente. Fazer desta passagem uma história real é o mesmo que dizer que todo pé de uva é Jesus, já que Ele se declarou: “Eu sou a videira verdadeira”. Ou ainda, ir a padaria comprar dois reais de Jesus. Ele não é o pão da vida ?
Digo isto porque estava ouvindo uma rádio Gospel local e a programação musical foi interrompida para “uma palavra amiga com Bispo”, que argumentou que Deus não quer que seus filhos sejam pobres. Lázaro, meu amigo e minha amiga, segundo o Bispo, morreu pobre por falta de fé, o que fica evidenciado no versículo 21, que diz que ele desejava alimentar-se com as migalhas que caiam da mesa do rico. Ele não queria um banquete, se satisfazia apenas com as migalhas, dava a entender o Bispo.
Como já dissemos, é uma parábola e qualquer especulação que fizermos a respeito do caráter, da personalidade, do emocional ou da vontade do Lázaro, fica restrita ao campo perigoso da mera especulação.
Esta parábola é uma das mais claras, das pronunciadas por Jesus, não havendo nenhuma necessidade de uma interpretação mais técnica, mais exegética. O Bispo usou esta passagem para fazer propaganda (enganosa, digno de passagem) de uma campanha para a prosperidade.
Já que a moda é fazer especulações com os personagens citados nos textos sagrados, não encontramos nada que condene o rico ao fogo eterno, a não ser a riqueza, como se vestia e como vivia.
Será pecado mortal ser rico ? Será pecado capital se vestir de púrpura e de linho finíssimo ? Tem alguma restrição em viver regalada e esplendidamente? O quê dizer então de pastores ricos, que moram em Miami, que tem carrões, mansões, aviões particulares e transportam até dinheiro nestes aviões? Será que estão condenados ao fogo eterno ? Será que todo mendigo vai para o seio de Abraão e isso faz da mendicância condição única para este ingresso ?
Outra pergunta que me incomoda bastante é: Será que a pobreza é sinônimo de falta de fé ?
Pois, se assim for, o inverso também é verdadeiro: Quanto mais rico, mais fé. Então, a galeria dos heróis da fé, de Hebreus 11 é uma espécie de revista FORBES, com a relação dos homens mais ricos do mundo, da época. Não é isto que diz e que quer dizer a palavra de Deus, no registro do livro de Lucas.
Bem, tem outras perguntas que gostaria de fazer ao Bispo: O Apóstolo Paulo, em Atos 21, foi preso por causa do amor ao evangelho de Cristo ou por crime de sonegação fiscal, evasão de divisas, lavagem de dinheiro ? Para quem ficou a fortuna dele, já que abriu várias igrejas, como Corinto, Filipos, Tessalônica, Éfeso ? Se ele fabricava tendas para sobreviver (Atos 18:3), seria uma mostra da sua pouca ou nenhuma fé ? Será que os outros apóstolos deixaram os seus bens (fazendas, aras, emissoras de rádios, canais de televisão), acumulados ao longo dos anos de ministério, e que só não estão descritos nas escrituras sagradas, porque não eram declarados ao IR ou estavam em nome de terceiros (laranjas), para a igreja ou para a família ? A Ilha de Patmos, onde João, por inspiração divina, teve a revelação, e escreveu o Apocalipse, era um paraíso fiscal ?
Estamos desvirtuando maldosa e criminosamente o evangelho de Jesus. Estamos desobedecendo flagrantemente aos princípios pregados pelo Mestre, Onde se lê: “não ajunteis tesouros na terra (Mat.6:19), ensina-se: Façam a corrente da prosperidade. Deus quer que sejamos ricos. Não tem um versículo, sequer, na Bíblia, que corrobore com tal afirmativa, muito pelo contrário, diz que é mais fácil um camelo passar no fundo de uma agulha do que um rico entrar no reino dos céus (Mat. 19:24). Palavras do próprio Jesus. Em quem devemos acreditar ? Será que eles querem nos levar para o céu ou para o inferno ?
O Bispo também se apegou ao versículo que diz: Eu vim para que vocês tenham vida, e a tenham em abundância (João 10:10). Primeiro que abundância não é sinal de riqueza. Quem mora no interior do interior, tem abundância de peixes, de tucumã, de açaí e até de filhos, mas não é rico. Segundo, a minha avó morreu aos 94 anos. Ninguém pode dizer que ela não teve vida abundante. Claro que teve ! Mas tem um detalhe: viveu e morreu pobre. O nosso glorioso, saudoso e inesquecível Ayrton Sena morreu jovem e era milionário.
Não sou contra a prosperidade. Muito pelo contrário, não podemos estar cegos para o fato de que vivemos numa sociedade materialista, consumista, num sistema capitalista cruel, assassino e globalizado. Por isso, prego e estimulo meus membros a buscá-la e a melhor força para se buscar é o estudo; estudar muito. Sou contra a maneira leviana, maldosa e demoníaca, com que usam as sagradas escrituras para induzirem as pessoas humildes e desesperadas ,à buscarem, de maneira utópica e sonhadora, o que nunca acharão. E os inúmeros testemunhos de pessoas que conseguem esta prosperidade ? Não sei. Quem me garante que elas conseguem ? Quem me garante que os testemunhos são verdadeiros ? Como acreditar em quem usa as escrituras sagradas para mentir descaradamente ? Cesteiro que faz um cesto, faz um cento.
O rico foi para o inferno, não porque era rico. Mas, porque, mesmo vivendo em abastança, não socorreu o mendigo Lázaro.
Dê uma olhada em volta da sua vida. Dê uma olhada na sua porta. Será que não tem alguém mendigando sua atenção, necessitando seu amor, carente do seu pão ?
É a lei de Murphy: Ninguém é tão pobre que não tenha alguém mais pobre do que ele.
No Evangelho de São Mateus, capítulo 25, versículo 41 em diante diz assim:
“Apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno, preparado para o diabo e seus anjos.
Pois tive fome e não me destes de comer; tive sede e não me destes de beber; fui forasteiro e não me recolhestes; estive nu e não me vestistes; enfermo e preso e não me visitastes.
Então eles também lhe responderão: Senhor, quando te vimos com fome, ou com sede, ou estrangeiro, ou nu, ou enfermo, ou preso, e não te servimos ?
Então lhes responderá: Em verdade vos digo que, todas as vezes que o deixastes fazer a um destes pequeninos, foi a mim que o deixastes de fazer. E irão estes para o castigo eterno, mas os justos para a vida eterna”.
EDSON BB DE JESUS
