Desde 2020, empresas gigantes de videogames têm investido cada vez mais em aquisições bilionárias de estúdios. Essas fusões costumam ser realizadas para aumentar o catálogo de jogos exclusivos ou expandir a área de atuação das produtoras, sem ter que começar do zero. Há, porém, uma dúvida que fica no ar: isso pode ser considerado formação de monopólio?
Antes de tudo, é importante mencionar que a estratégia de comprar estúdios é antiga e bastante comum no mercado de games. Há registros de fusões bem-sucedidas desde 1992 — ano em que a Electronic Arts adquiriu a desenvolvedora Origin, responsável pelas clássicas franquias Ultima e Wing Commander. Naquela época, contudo, as transações eram bem mais baratas e não chegavam aos bilhões de dólares, como hoje em dia.
Pouco se falava quando uma publicadora gigante comprava uma desenvolvedora de pequeno ou médio porte. Muitas vezes, as aquisições eram vistas como formas de “salvar” os estúdios menores da possível falência. As produtoras sabiam criar verdadeiras obras-primas do entretenimento interativo, mas acabavam perdendo dinheiro pela falta de experiência em publicação e marketing.
Entretanto, essa visão tem mudado nos últimos dois anos. Em vez de focar somente na aquisição de estúdios menores, as gigantes dos games passaram a olhar não só para desenvolvedoras mais valiosas, como também para as grandes holdings. Das 41 fusões entre empresas de jogos realizadas entre 2020 e 2022, 12 delas — quase 30% — custaram mais de US$ 1 bilhão.
Microsoft está investindo pesado na compra de holdings
Em setembro de 2020, a Microsoft anunciou sua primeira grande aquisição de uma holding: a ZeniMax Media — dona da produtora Bethesda e de outros estúdios, como Id Software, Arkane e mais — por US$ 8,1 bilhões. Essa transação chamou atenção não só pelo preço exorbitante, como também pelo fato da ZeniMax Media ter várias desenvolvedoras embaixo do seu guarda-chuva ao mesmo tempo.
Isso deixou alguns jogadores preocupados, em especial os donos de consoles PlayStation. Afinal, todos os lançamentos dos estúdios da ZeniMax Media, a partir de agora, serão exclusivos do Xbox. Quem quiser jogar Starfield, The Elder Scrolls 6 ou até mesmo um futuro Fallout, será obrigado a comprar um Xbox ou montar um PC gamer com Windows.
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A Microsoft não está cometendo nenhum crime ao adotar essa estratégia, até porque suas principais concorrentes — Sony e Nintendo — dependem de franquias exclusivas para vender consoles desde sempre. Nessa corrida, os jogadores de Xbox ficaram comendo poeira por muito tempo, e a Microsoft está tentando compensar seus fãs pela demora.
Para garantir ainda mais espaço no mercado, a Microsoft adquiriu outra holding gigante, em janeiro de 2022: a Activision Blizzard , por impressionantes US$ 69 bilhões. Ainda não sabemos se os futuros jogos de franquias como Call of Duty, Crash Bandicoot, Overwatch e Diablo serão exclusivos do Xbox. Porém, é difícil acreditar que uma empresa pagaria todo esse dinheiro para continuar publicando seus títulos em outras plataformas.
Afinal, há chance de formação de monopólio?
Há, porém, um problema que tem incomodado até mesmo órgãos governamentais dos EUA: uma suposta possibilidade de formação de monopólio. Até 2020, Microsoft, Sony e Nintendo só compravam estúdios separadamente. Adquirir uma holding inteira é uma situação completamente diferente, com impacto muito maior no mercado.
Por esse motivo, a Comissão Federal de Comércio e a Divisão Antitruste do Departamento de Justiça dos Estados Unidos estão avaliando o acordo mais recente entre Microsoft e Activision Blizzard para ver se há chance da fusão entre as empresas prejudicar o mercado ou os consumidores de alguma forma. Dependendo da avaliação dos órgãos, isso pode atrasar ou até impedir a conclusão do acordo.
Para entender melhor essa situação e saber se as aquisições da Microsoft e até mesmo da Sony podem ser prejudiciais para o mercado de games, o Tecnoblog buscou um especialista no assunto.
À reportagem, o advogado Rodrigo de Mattos Silva Rodrigues explicou o seguinte: “Por si só, a eventual conclusão das aquisições desses estúdios por Microsoft ou Sony não pode ser considerada como um movimento em direção à formação de monopólio. Isso porque, conceitualmente, monopólio é uma estrutura na qual existe apenas uma empresa atuando em determinado setor, o que não seria a consequência daquelas operações”.
“O sinal de alerta acende quando se começa a avaliar o poder de mercado que a aquisição desses estúdios conferirá a empresas como Microsoft e Sony. É importante esclarecer que a competição não é afetada negativamente só quando há concentração de um percentual alto do mercado nas mãos de uma ou outra empresa, mas também pelo poder de influência direta que essas gigantes (com o portfólio adquirido) poderão ter sobre características relevantes do mercado de jogos: como o acesso ou não a determinados títulos (tanto pelas plataformas concorrentes quanto pelos jogadores), a obrigatoriedade de assinaturas online, e a escalada no preço de games e serviços relacionados. É sobre isso que as agências governamentais deverão se debruçar com mais afinco”, explicou.
Em resumo, não tem monopólio, por enquanto. Vale lembrar que fusões entre empresas não acontecem do nada, nem são finalizadas da noite para o dia. Normalmente, isso leva meses de negociação até o acordo ser concluído. Precisamos esperar até o ano que vem para saber o resultado desse acordo entre Microsoft e Activision Blizzard.
Algumas pessoas acreditam que a Sony teria comprado a Bungie por US$ 3,6 bilhões como resposta à recente aquisição da Microsoft. Contudo, é impossível fechar um acordo como esse tão rápido. É provável que a negociação tenha começado em 2021 e só foi agilizada para reforçar a estratégia da PlayStation Studios.
De qualquer forma, tanto a Microsoft quanto a Sony devem continuar investindo na compra de estúdios, porque exclusivos vendem consoles e atraem novos jogadores para dentro dos ecossistemas das empresas. Esse não é o cenário ideal para os consumidores, que precisam ter mais de uma plataforma em casa para se divertirem com todos os jogos, mas não há o que se fazer para impedir isso.