As mudanças na Constituição ganharam ritmo acelerado no governo do presidente Jair Bolsonaro, que planeja mais alterações neste ano eleitoral. De 2019 até agora, foram 16 modificações —uma emenda à Carta passou a vigorar a cada 71 dias.
Há exemplos de temas estruturais, como a reforma da Previdência, mas prevalecem textos com dribles a regras fiscais, caso do adiamento ao pagamento de precatórios — maneira também de fortalecer o caixa, com o projeto de reeleição adiante — e acenos a categorias que tendem a apoiar o governo, a exemplo da criação da polícia penal.
A média no atual governo é próxima à verificada na segunda gestão de Fernando Henrique Cardoso, com uma alteração a cada 76 dias — nos primeiros quatro anos do tucano, o ritmo foi mais lento, a cada 91 dias. A realidade é diferente, porém, dos governos de Luiz Inácio Lula da Silva (uma a cada 104 dias), do período Fernando Collor-Itamar Franco, quando houve uma alteração a cada 437 dias, e da passagem de Dilma Rousseff — uma a cada 85 dias no primeiro mandato, e um intervalo de 97 dias nos quatro anos finais, em que parte do período teve Michel Temer na Presidência.
Algumas das PECs analisadas pelo Congresso chegam a ter até o prazo da validade, por tratarem de modificações transitórias, caso da ofensiva mais recente, apoiada por Bolsonaro, que busca reduzir o preço de gasolina, diesel e gás. Dois textos tramitam simultaneamente com objetivo de alterar a cobrança de impostos. A iniciativa, porém, não trata de um ponto estrutural: o emaranhado tributário, citado por especialistas como fator de fuga de investimentos do país.
Ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Carlos Ayres Britto afirmou que o número de 115 emendas desde que a Constituição entrou em vigor configura um “desastre” institucional.
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“É preciso ter a clareza de que a Constituição não é do Estado. É da nação, reunida em Assembleia Constituinte. Quando o Estado mexe na Constituição, é preciso ter cuidado. É uma alteração em obra alheia. A nação é anterior ao Estado. Parlamentares e presidentes da República, infelizmente, não sabem disso e mexem aleatoriamente e demasiadamente. É um atentado intrínseco. Não dá tempo à Constituição para respirar”.
Desde que assumiu a cadeira, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), tem adotado postura oposta à preconizada por Britto. Em fevereiro do ano passado, por exemplo, tentou imprimir uma tramitação a jato de proposta que ficou conhecida como “PEC da impunidade”. Na esteira da prisão do deputado Daniel Silveira (PSL-RJ), Lira encomendou um texto com o propósito de ampliar a imunidade parlamentar. Após intensa pressão, a votação foi adiada, e o tema não retornou à pauta.
Durante a semana, Lira avisou que uma outra PEC deve ser analisada em breve. O texto, aprovado em comissão especial na quarta-feira, aumenta de 65 para 70 anos a idade máxima para nomeação de juízes e ministros em tribunais superiores. Segundo ele, é uma adaptação à aprovação da PEC da bengala, aprovada em 2015, que postergou a aposentadoria de magistrados.
“Houve um embarreiramento nas carreiras jurídicas. O Congresso pode corrigir essa falha de maneira rápida, porque não vejo polêmica nessa PEC”, disse Lira.
Nas últimas semanas, líderes começaram a debater também uma outra ideia: dar encaminhamento a uma PEC que libera partidos de manter o compromisso assumido ao formar federações. O instrumento, aprovado no ano passado, permite a união de siglas por quatro anos. O objetivo, porém, é possibilitar a aliança apenas durante o período eleitoral, para preservar partidos menores de extinção.