O ex-juiz e ex-ministro Sergio Moro (Podemos) planeja se manifestar contra o que classifica como “erotização precoce de crianças” numa carta de “princípios para os cristãos”, dirigida especialmente ao eleitorado evangélico.
O documento, que será divulgado em um evento para cerca de 200 pastores em Fortaleza, na próxima segunda-feira, vem sendo elaborado por Moro junto ao coordenador de seu núcleo de campanha para evangélicos, Uziel Santana, ex-presidente e fundador da Anajure (Associação Nacional de Juristas Evangélicos), e membro da Igreja Batista.
O termo “erotização precoce”, segundo especialistas, define a exposição de conteúdos inadequados à faixa etária infantil ou até da própria criança em situação sexualizada. Trata-se de algo distinto à educação sobre gênero, sexualidade e diversidade sexual, cujo debate é apontado por especialistas como necessário, inclusive nas escolas.
Em suas redes sociais, no início do ano, Moro usou a expressão “sexualização precoce” ao marcar posição contrária ao tema. Na campanha de 2018, o presidente Jair Bolsonaro (PL) usou a pauta para atacar uma suposta “ideologia de gênero”, expressão considerada enganosa, e para acusar falsamente seu adversário, o petista Fernando Haddad, pela criação de um “kit gay”, cuja existência foi desmentida pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Sem o apoio de lideranças das principais igrejas, que hoje orbitam em torno de Bolsonaro ou, em menor número, buscam pontes com o ex-presidente Lula (PT), Moro usará a carta como um aceno a fiéis evangélicos, na tentativa de aumentar sua entrada no segmento.
Na semana passada, outro presidenciável que concorre na chamada terceira via, Ciro Gomes (PDT), participou, também na capital cearense, de um culto na igreja do deputado estadual Apóstolo Luiz Henrique (PP), acompanhado pelo ex-deputado Cabo Daciolo, que é evangélico.
O evento de Moro está agendado para um centro empresarial de Fortaleza, no qual o presidenciável do Podemos lerá seu documento e pretende ouvir sugestões das lideranças evangélicas.
Apesar do apelo a bandeiras conservadoras e de costumes – além da crítica à “erotização precoce”, a carta marcará posição contra a ampliação de casos passíveis de aborto legal –, o ex-juiz tende a evitar assuntos como o acesso a armas de fogo e a legalização dos jogos de azar.
O pretexto usado pela equipe de Moro é que ambos os temas, que despertam rejeição significativa entre evangélicos mas encontram apoio em grupos conservadores, extrapolam as prioridades do segmento religioso.
Quando foi ministro da Justiça no governo Bolsonaro, Moro não se posicionou sobre jogos e disse ser favorável a “alguma flexibilização” à posse de armas, mas foi criticado pelo presidente por supostamente oferecer entraves à pauta.
Leia Também
A carta também fará acenos ao papel das igrejas “na preservação da ordem constitucional e da democracia” e também na manutenção de liberdades civis, num movimento para tentar atrair evangélicos insatisfeitos com o bolsonarismo.
O texto argumentará ainda que as imunidades tributárias concedidas a entidades religiosas estão em equilíbrio com o “compromisso social” dessas instituições.
O assunto é caro à bancada evangélica do Congresso, que derrubou no início do ano passado um veto presidencial, com incentivo do próprio Bolsonaro, e permitiu o perdão de quase R$ 1 bilhão em dívidas de igrejas por tributos não recolhidos.
Como revelou no último sábado a colunista Bela Megale, do GLOBO, o núcleo da campanha de Moro com enfoque no eleitorado evangélico vem fazendo um monitoramento de encontros e de relacionamento com pastores.
A lista, apelidada de “morômetro”, serve como referência para avaliar a entrada do presidenciável nas entidades religiosas. Apesar disso, a carta de Moro deve afirmar que sua campanha “não busca” receber apoios de igrejas em caráter institucional, mas sim individualmente de lideranças e seguidores.
Moro já se reuniu neste ano com lideranças que fazem parte do bloco de apoio a Bolsonaro, como R.R. Soares, da Igreja Internacional da Graça, e Estevam Hernandes, da Renascer em Cristo.
O presidente, por sua vez, procura manter em seu bloco de apoio igrejas como a Universal, ligada ao Republicanos, partido que deve integrar a coligação de Bolsonaro, e diferentes alas da Assembleia de Deus.
O Ministério de Madureira, por exemplo, que tem como representante em São Paulo o atual presidente da bancada evangélica na Câmara, Cezinha de Madureira (PSD-SP), viu lideranças do Rio, como o bispo Abner Ferreira, trocarem acenos recentes com Lula e aliados do PT.