O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), multou o X (antigo Twitter) em R$ 700 mil por descumprimento de uma ordem de retirada de postagens que chamavam de “estuprador” o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL).
A rede social havia sido notificada pelo STF em 13 de junho, mas não cumpriu a decisão. Atendendo pedido de advogados de Lira, Moraes havia dado duas horas para o X remover o perfil autor da acusação, sob pena de multa diária de R$ 100 mil. Agora a plataforma tem cinco dias para quitar o valor, a partir da intimação.
Moraes também determinou que o perfil seja bloqueado em até uma hora, sob pena de outra multa diária de R$ 200 mil para cada uma das sete URLs em questão. O ministro ainda alertou que o representante legal do X no Brasil pode ser processado pelo crime de desobediência.
“A provedora de rede social ‘X’, ao não cumprir a determinação judicial, questiona, de forma direta, a autoridade da decisão judicial tomada na presente ação”, escreveu Moraes na decisão mais recente.
Ele ressaltou que, “como qualquer entidade privada que exerça sua atividade econômica no território nacional, a provedora de rede social X deve respeitar e cumprir, de forma efetiva, comandos diretos emitidos pelo Poder Judiciário”.
Dono do X, o bilionário sul-africano Elon Musk é investigado no STF pelo suposto cometimento dos crimes de obstrução à Justiça e incitação ao crime. Ele já se manifestou publicamente contra decisões do Supremo e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e ameaçou não cumpri-las.
Publicações feitas após urgência do PL do aborto
Os tuítes contra Lira foram postados em 13 de junho, um dia após a aprovação do regime de urgência do projeto de lei que equipara o aborto realizado após 22 semanas de gestação ao crime de homicídio, mesmo se a gravidez derivou de estupro. Comandada por Lira, a sessão da urgência durou 24 segundos.
Um dos tuítes viralizou na rede social e, segundo advogados de Lira, foi impulsionado pela repercussão da urgência na tramitação do projeto de lei. Em um dia, o tuíte postado por uma usuária identificada como Amandinha (no perfil @mandsfra2), teve 250 mil visualizações, 10 mil curtidas e 4 mil retuítes.
Usuária citou acusação de ex-mulher de Lira
“Urgente: Ex acusa Lira de estupro: ‘Me esganava e dizia: ‘Tá atrás de homem?’ No dia 5 de novembro de 2006, seis meses após terem se separado, Jullyene diz ter sido agredida e estuprada pelo parlamentar depois de ele saber que ela estaria se encontrando com um homem”, escreveu a usuária. O tuíte de Amadinha encerrava com a mensagem “Lira estuprador” em letras maiúsculas.
O post se referia às acusações de agressão da ex-mulher de Lira ao parlamentar, que voltaram à tona com uma reportagem publicada pela Agência Pública em junho do ano passado e intitulada “Ex mulher de Lira o acusa de violência sexual”. Foi a primeira vez que Jullyene deu entrevista dizendo que Lira a violentou sexualmente. Ela repetiu acusações apresentadas anteriormente à Justiça.
Em 2015, a Segunda Turma do STF absolveu Lira das acusações de agressão doméstica, por falta de provas, conforme posição defendida à época pelo Ministério Público. Por esse motivo, as alegações de Jullyene foram consideradas ilícitas pela Justiça, tanto no Distrito Federal quanto em Alagoas, que mandou remover uma série de postagens contra Lira que foram publicadas por Jullyene.
Defesa se manifestou em ação que Lira não é parte
No ano passado, o Tribunal de Justiça do DF mandou remover a reportagem da Agência Pública com o depoimento de Julyenne. Em março deste ano, Moraes negou um recurso do veículo de comunicação contra a censura. Foi no âmbito dessa ação no STF que Lira entrou com o pedido para bloquear o perfil Amandinha.
Lira não é parte do processo, que consiste numa reclamação da Agência Pública contra a decisão da Justiça do DF. Mas a defesa do presidente da Câmara pediu para atuar como “interessado” no processo e pediu a remoção de links do X, sob alegação de que há um “movimento claramente coordenado e orgânico, de nova replicagem, de forma circular, de conteúdo ofensivo e inverídico”.
Os advogados argumentaram ainda, no pedido ao STF, que a “divulgação de notícia mentirosa” e “altamente ofensiva”, tem o “claríssimo propósito de desestabilizar não apenas a figura política [de Lira], mas também de atingir o exercício da elevada função da Presidência da Câmara dos Deputados”.
Moraes acatou o argumento e acrescentou que se trata de conteúdo de ódio, que coloca em risco a democracia, ressaltando que a manifestação da autora dos posts nada tem a ver com liberdade de expressão.
“Se torna necessária, adequada e urgente a interrupção de propagação dos discursos com conteúdo de ódio, subversão da ordem e incentivo à quebra da normalidade institucional e democrática mediante bloqueio de contas em redes sociais, com objetivo de interromper a lesão ou ameaça a direito”, escreveu o ministro na decisão publicada no dia 13 e que determinava a remoção dos posts.
“A plena proteção constitucional da exteriorização da opinião não significa a impossibilidade posterior de análise e responsabilização por eventuais informações injuriosas, difamantes, mentirosas, e em relação a eventuais danos materiais e morais, pois os direitos à honra, à intimidade, à vida privada e à própria imagem formam a proteção constitucional à dignidade da pessoa humana”, completou.
O Tempo