Foto: EFE/EPA/JIM LO SCALZO

WASHINGTON, EUA (FOLHAPRESS) – Enquanto a tendência nacional americana é de queda nas taxas de violência, o número de homicídios em Washington saltou 36% de 2022 para 2023, levando o país a relembrar a alcunha de “capital dos assassinatos” pela qual a cidade ficou conhecida nos anos 1990.

Em números absolutos, foram 274 crimes desse tipo no ano passado, o maior patamar desde 1997. O índice representa 40 mortes por 100 mil habitantes, praticamente o dobro da registrado na cidade do Rio de Janeiro (21,2) e cinco vezes o de São Paulo (7,3), segundo dados mais recentes do Anuário Brasileiro de Segurança Pública.

Em comparação com os 60 maiores municípios americanos, apenas quatro —Nova Orleans, Cleveland, Baltimore e Memphis— têm taxas de homicídio mais elevadas do que Washington. E, com exceção de Memphis, todas as outras viram esse número cair no ano passado.

Considerando uma lista maior, representativa do país —são cerca de 200 municípios maiores e menores, mais urbanizados ou rurais—, os homicídios caíram 12,4%. Extrapolando para o cenário nacional, isso significa uma redução da taxa por 100 mil habitantes de 6,34 para 5,53 de 2022 para 2023.

Os dados foram compilados pela consultoria de análise de dados AH Datalytics, com base em informações públicas, e têm caráter preliminar. As estatísticas oficiais de criminalidade dos EUA para o ano completo, organizadas pelo FBI, serão divulgadas nos próximos meses.

Se confirmada a tendência captada pela consultoria, será a maior queda anual na taxa de homicídios no país desde pelo menos 1960.

Nesse cenário, o aumento da violência em Washington intriga especialistas. As motivações dos crimes variam, e muitas são banais: em agosto, por exemplo, uma adolescente de 16 anos esfaqueou outra da mesma idade por uma briga motivada por molhos do McDonald’s. Em dezembro, um homem de 85 anos foi preso por matar a mulher, de 81, após uma discussão envolvendo panquecas.

O motorista de aplicativo Nasratullah Ahmad Yar, 31, foi morto em julho no que se suspeita ter sido uma tentativa de roubo do seu carro. Ele havia emigrado do Afeganistão para os EUA com a família, fugindo do Talibã.

A principal hipótese para o aumento do número de homicídios é uma conjunção de fatores envolvendo a alta circulação de armas na cidade, o contingente policial em seu menor número em décadas, rivalidade entre gangues e uma estrutura penal complexa que mistura as esferas local e federal, única à capital do país.

Os crimes se concentram nas áreas mais pobres e negras da cidade, ao leste e sul do Distrito de Colúmbia. Segundo dados da polícia, 86% dos assassinatos foram cometidos com armas de fogo.

“Há muito mais armas nas comunidades agora, muito mais do que eu vi em todo o meu tempo no departamento de polícia”, afirmou o então chefe do Departamento de Polícia Metropolitana, Robert Contee, à CBS em abril de 2023, às vésperas de ser substituído.

Ecoando o argumento da associação policial local, ele atribuiu o agravamento do problema também à redução de efetivo.

Com um quadro menor, a taxa de resolução dos homicídios vem caindo expressivamente —de 71% em 2017 para 41% no período de janeiro a setembro do ano passado, o dado mais recente disponível.

A perspectiva de impunidade é apontada como um dos principais fatores para explicar a disparada da criminalidade na cidade e colocada na conta da prefeita democrata Muriel Bowser, no cargo desde 2015.

Agora, em resposta à pressão crescente para reagir ao aumento da criminalidade, Bowser recuou na agenda progressista e implementou um toque de recolher durante a noite. De domingo a quinta-feira, menores de 17 anos não podem estar sozinhos na rua das 23h às 6h. Às sextas e aos sábados, o horário vai de 0h01 às 6h.

“Washington costumava ser uma cidade muito segura, e eu sempre me senti confortável andando sozinha”, diz Olivia Dunn, 25, que mora na capital americana desde os 18. “Agora eu fico em casa à noite e checo e recheco se todas as portas estão trancadas.”