Foto: Amazonas Energia/Divulgação

Desde a instalação polêmica dos medidores do Sistema de Medição Centralizada (SMC), mais conhecidos como “medidores aéreos”, até a campanha publicitária que chama os consumidores de criminosos, a concessionária de energia Amazonas Energia tem se envolvido em uma sequência de controvérsias que tem “manchado”, cada vez mais, a imagem da empresa. Além de ser, constantemente, acusada de “fazer pouco caso” da população amazonense, os ex-funcionários da concessionária de energia Amazonas Energia também são tratados com descaso pela empresa.

Em busca de respostas e há quase uma década na Justiça, os trabalhadores entraram em contato com a redação do portal de notícias Amazônia Press para relatar que não receberam os seus direitos e indenizações. Em entrevista gravada, o ex-funcionário da extinta D5 e Super Luz – empresas terceirizadas que prestavam serviço de plantão para a concessionária de energia – Genilson Tavares de Mendonça, de 53 anos, aguarda há sete anos receber todos os seus direitos e indenizações fruto do seu trabalho.

“Essas empresas declararam falência, ambas são do mesmo dono João Vigílio. Foram mais de 240 funcionários, pais de família, que ficaram ‘a ver navios’. Então, quando a Amazonas Energia comprou em 2018 a Eletrobrás, ficou de pagar todos os funcionários em 2022. Só que nesse ano, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) simplesmente deu uma canetada e tirou a Amazonas Energia do processo. Ela havia se comprometido a pagar e mexeram em algo que acabaram sacaneando a gente lá em Brasília. É uma ‘peleja’. A minha advogada disse que teríamos esperar por algum processo, só que esse dono não tem nada no nome dele e todo mundo o conhece aqui em Manaus. Ele era dono de uma concessionária de veículos e nós víamos ele dando carro de presente para o pessoal da Amazonas Energia. Era muita coisa. Sacanearam todos nós, trabalhadores, que ficávamos ali dia e noite oferecendo a nossa mão de obra. Sö sei que tem muita gente em processo contra essa empresa”, declarou.

“Essa empresa fez um monopólio no Amazonas. Essa empresa e a Norte Tech são do mesmo dono, ou seja, ele terceirizou um trabalho dele mesmo. Nessa empresa, eles fazem a gente de cobaia. Aqui no V8 tem um condomínio de luxo e os serviços dentro desses locais devem ser particulares. Todos esses serviços são privados. Eles fizeram os funcionários se descaracterizarem, trocar de farda, cobrir a placa da Amazonas Energia e trocar todas as luminárias de lá. Eles tomam conta do Amazonas inteiro. Nós somos a fonte de tudo e se nós parássemos, Manaus parava. Eles nos chamavam de ‘Tropa de Elite’ e nos jogaram no lixo. O que mais complica, na realidade, é que os caras tem medo, ainda mais que eles ameaçavam direto que, quem jogasse a Amazonas Energia na Justiça, não se empregaria mais no Amazonas. Com essas ameaças, o pessoal foi deixando de lado o processo. A indignação de estar esperando esse tempo todinho um dinheiro pelo qual trabalhou por anos da sua vida e ter um desprezo desse. Ver o cara que você trabalhou e enriqueceu às custas do seu trabalho te menosprezando dessa forma é algo muito triste”, declarou.

Genilson Tavares de Mendonça, de 53 anos, também comentou sobre o projeto ‘Energia Solidária’, uma ação da Amazonas Energia que conta com a participação de colaboradores da Empresa que ajudam na montagem e entregas dos kits para auxiliar várias famílias que estão passando necessidades. O projeto ‘Energia Solidária’ tem como slogan: Mais que energia, distribuindo solidariedade para o Amazonas.

“Aquilo ali é uma baita de uma safadeza. Os funcionários da empresa não tem direito de pegar um rancho daquele. Sabe quem pega esses ranchos? Supervisor e seus parentes, mas o cara que está ali ralando na rua não tem o direito de pegar. Outro dia denunciei o gerente do setor, pois cansei de vê-lo passando com duas cestas básicas e colocando no carro, enquanto nós ficávamos olhando ele fazer tudo aquilo. O salário dele é quase 30 vezes maior que o nosso e nem precisava daquilo.

Além disso, durante o seu depoimento, revelou outras situações constrangedoras que viveu durante o período de trabalho e o ex-funcionário declarou ainda as alienações políticas que os funcionários da época passavam. Confira a gravação:

Após nove anos trabalhando na D5 e dois anos na Super Luz, Conrado Gomes, relata com indenização que, até o momento, ele e outros ex-funcionários não receberam nada da concessionária de energia.

“Já está com nove anos que é só audiência e nunca pagam. Somos pra mais de 500 funcionários e, desse tanto, apenas 200 receberam. O restante não recebeu nada até hoje e só temos audiências”, declarou.

A mesma situação aconteceu com Francisco Elison de Barrozo, de 37 anos. Há sete anos na Justiça contra a concessionária de energia, ele ressalta que, assim que foi demitido, precisou buscar medidas judiciais para ter o seu direito.

“Até agora o nosso processo está só rolando… nada de recebermos 1 centavo. Assim que saímos demos entrada nas papeladas e até agora nada. Alguns amigos ainda tiveram a sorte de receber, mas os outros ainda não tiveram retorno. Em nenhum momento a empresa prestou algum esclarecimento para a gente”, frisou.

Eldadd Felix da Silva trabalhou por cerca de 11 anos na concessionária de energia e, até os dias atuais, revela que se impressiona com a forma que os ex-funcionários da empresas são tratados e negligenciados.

“Nos últimos anos 9 anos que estamos na Justiça eles não estão nem preocupados com a gente. Não é tão importante para eles. Ficam ’empurrando com a barriga’, dizem que vão pagar e não pagam. Não tem mais audiência. Todas as audiências que tínhamos acabou e estamos apenas esperando a boa vontade deles. São muitos anos de dedicação para, no final, não termos amparo algum. Chega a ser desesperador”, disse.

Solicitamos o posicionamento da concessionária de energia Amazonas Energia, que questionou se a equipe de reportagem “possui mais detalhes sobre o assunto, úmeros de processo, nomes ou informações”. Encaminhamos o número dos processos e, até o momento, não obtivemos respostas

Assédio moral e coação eleitoral

Vale relembrar que, em outra ocasião, funcionários da concessionária de energia entraram em contato com a equipe de jornalismo do portal de notícias Amazônia Press para revelar os assédios morais e pressão psicológica sofridos no local.

Além disso, eles também denunciam o não cumprimento das recomendações de políticas internas da empresa, visto que, com o apoio do maior acionista e vice da concessionária, os então candidatos a deputado estadual Radyr Oliveira, também Diretor Técnico do Interior, e deputado federal Orsine Júnior (PSD), filho de Orsine Rufino, “fizeram a festa” nas vésperas do primeiro turno das Eleições e usaram a terceirizada como palanque eleitoral.

Um dos relatos aconteceu no momento em que a empresa construiu uma nova estrutura física para funcionamento da sua sede, localizada no bairro de Flores. De acordo com a denúncia publicada no jornal do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Urbanas no Estado do Amazonas (STIUAM), o acionista majoritário da empresa apresentou o referido local através de uma transmissão ao vivo, mostrando o local como se fosse um “paraíso/céu”, mas alega que os trabalhadores passam pelo inferno, por sobrecarga de trabalho, situações vexatórias e pressão psicológica em nome da garantia do emprego.

Na nova sede há uma estrutura com a imagem da Sagrada Família que é monitorada por câmeras, e colaboradores costumam passar pelo local com frequência, seja para ir aos toaletes ou se deslocarem para outros departamentos para cumprirem suas demandas. Os mesmos são abordados para saberem o motivo de estarem circulando pelo local, sendo motivo de assédio até mesmo parar para tirar foto da imagem. As pessoas são abordadas e questionadas sobre qual sua função na empresa ao passarem pela Sagrada Família e muitas vezes após responderem escutam um: “Só isso! Você tem que produzir mais porque ganha muito!”.

“Lamentavelmente, estamos presenciando um grande retrocesso em termos comportamental da gestão da empresa, que usa como método o assédio no ambiente de trabalho, usando metodologias que afetam negativamente os aspectos físicos e psicológicos dos trabalhadores. O Sindicato está de olho nessa situação e estará sempre em defesa dos trabalhadores, assim como não se furtará em denunciar o assédio nos fóruns cabíveis e legais”, diz o comunicado.

A família é sagrada, mas o almoço dos funcionários não. Outra condição imposta aos trabalhadores é a proibição de almoçar em suas salas, mesmo o novo espaço não tendo como acomodar todos os funcionários ainda que hajam turnos para que os mesmos almocem.

“Não cabem todos no espaço do refeitório mesmo com escalas de horário. As fichas para acesso ao local são limitadas, e quem leva comida de casa para esquentar sofre na fila do microondas, tem que comer na pressa e se passar do horário de almoço e você não consegui almoçar, vai ficar com fome já que é proibido comer na mesa de trabalho ou qualquer outro lugar sem ser ameaçado de demissão”, contou um empregado.

A equipe de jornalismo do portal Amazônia Press entrou em contato com a assessoria de comunicação da Amazonas Energia em busca de mais esclarecimentos, mas até o momento não obtivemos retorno.

“Quem é contra o medidor, é a favor do crime”

Recentemente, a campanha que diz “Como impediremos furtos, você que é honesto pagará menos pela energia. Quem é contra o medidor, é a favor do crime”, causou grande polêmica entre a população, parlamentares e órgãos públicos. Por meio das redes sociais, a defensora pública Carol Braz postou uma declaração contrária à campanha publicitária publicada pela concessionária de energia Amazonas Energia.

Em uma publicação, Carol relembrou que a Defensoria, por meio do Núcleo de defesa do Consumidor, conseguiu uma decisão da justiça para impedir a instalação dos novos medidores com sistema de medição centralizada (SMC).

“AMAZONAS ENERGIA, ME RESPEITA! RESPEITA O POVO DO AMAZONAS! A Defensoria, pelo Núcleo de defesa do Consumidor, conseguiu uma decisão da justiça para impedir a instalação dos novos medidores, os chamados SMC. Agora, com total desrespeito, a empresa lançou uma propaganda dizendo que quem é contra o SMC é a favor do crime. Ontem mesmo, o núcleo de defesa do consumidor da Defensoria, já entrou com um pedido na justiça para obrigar a Amazonas energia a retirar imediatamente a propaganda do ar. Portanto, a instalação do SMC continua PROIBIDA pela justiça. Amazonas Energia, eu sou contra o SMC e não sou a favor do crime. Me respeita! As pessoas do meu estado, não são criminosas! Respeita o povo do Amazonas”, diz a publicação.

Em entrevista do portal Amazônia Press, a defensora pública ressaltou que esteve acompanhando o movimento das comunidades desde novembro de 2021, no momento em que famílias humildes foram afetadas pelos valores nas contas de energia após as instalações dos novos medidores

“Essa movimentação começou no núcleo 16 da Cidade Nova. Foi quando começaram a instalar os novos medidores e as pessoas começaram a perceber um aumento significativo nas contas de energia. Não defendemos gato ou desvio de energia, mas as pessoas tiveram muitos contadores estavam contando o consumo de outras famílias. Verificamos e vimos essas situações. Famílias muito humildes, que sobrevivem mal com um salário mínimo, com contas de 900 a mil reais. Realmente eu me sensibilizei com a situação dessas pessoas e comecei a acompanhar a mobilização, além de falar sobre o direito dessas pessoas. Levei o grupo para a Defensoria e ingressamos na Justiça. A Defenoria conseguiu uma liminar para suspender esses novos medidores. Desde lá estamos acompanhando muitas famílias que precisam ou precisaram decidir entre pagar a conta de energia ou comprar comida para a própria casa”, disse.

Complementou ainda: “Eu sou contra esses novos medidores, o material que eles usam é errado, tem a questão da poluição visual que é algo absurdo e a Justiça proibiu tudo isso. A gente se surpreende com essa propaganda que trata e ofende a população tratando todos como criminosos. Quem defende a população, defende por acreditar no que é certo. Eu defendo que essa concessionária perca a concessão, pois eles não respeitam o povo do Amazonas. O que eles estão fazendo com o povo, além de sacrificar o nosso bolso, é não respeitar o nosso caráter. Alem de tudo, não temos concorrência como em outros estados. Isso acaba deixando a concessionária fazer o que bem entende pela falta de concorrência”.

O Ministério Público do Amazonas (MP-AM) emitiu uma recomendação ao diretor presidente da Amazonas Energia, Márcio Pereira Zimmermann, solicitando a retirada de uma propaganda considerada ofensiva sobre a instalação do Sistema de Medição Centralizada (SMC). A decisão foi assinada pela promotora de justiça substituta Sheyla Andrade dos Santos e publicada no Diário Oficial do MP-AM no dia 2 de junho.

No documento, a promotora recomenda que a empresa retire a propaganda dos meios de comunicação no prazo de 24 horas, devido ao seu conteúdo ofensivo divulgado na mídia. O descumprimento da recomendação pode implicar na adoção de medidas administrativas e ações judiciais contra o responsável.

A recomendação do Ministério Público visa garantir que a publicidade seja retirada de circulação, levando em consideração a possibilidade de prejudicar a imagem de pessoas ou grupos contrários à instalação dos medidores aéreos.

Espera-se que a concessionária acate a recomendação dentro do prazo estabelecido pelo MP-AM, promovendo uma comunicação mais adequada e respeitosa com os consumidores e a sociedade em geral.

Risco de perda de contrato no Estado

Em decorrência da situação envolvendo a instalação dos medidores aéreos e da insatisfação dos consumidores, a concessionária de energia Amazonas Energia pode ser alvo de uma “quebra de contrato” com o Estado. A proposta foi apresentada no dia 30 de maio pelo vereador Sassá da Construção Civil (PT) no plenário da Câmara Municipal de Manaus (CMM).

De acordo com o parlamentar, a empresa – que é uma das campeãs de reclamações nos órgãos de defesa do consumidor no Amazonas – tem insistido na instalação dos medidores aéreos, contrariando os mais de dois milhões de manauaras e sinalizando o descontentamento dos consumidores com os serviços prestados pela Amazonas Energia. Ao sugerir o fim do contrato com a concessionária, o parlamentar declara que os consumidores perderam a confiança na empresa.

“Se o povo não confia mais, por que não podemos pedir a quebra desse contrato contra a empresa que lidera número de reclamações nos órgãos de apoio ao consumidor. Mas todos temos que nos pronunciar, eu como vereador eleito pelo povo de Manaus, estou ao lado da sociedade, resta saber que mais vai enfrentar a Amazonas Energia”, declarou.

O parlamentar relembrou ainda a campanha publicitária publicada pela concessionária de energia Amazonas Energia que diz “Como impediremos furtos, você que é honesto pagará menos pela energia. Quem é contra o medidor, é a favor do crime”, que causou grande polêmica entre a população, parlamentares e órgãos públicos.

“A Amazonas Energia comprou briga com dois milhões de pessoas que não querem os medidores aéreos de energia. Inclusive chamou de ladrão todas as pessoas que são contra o equipamento, ou seja, dois milhões de ladrões em Manaus”, criticou.

Em todas as situações, entramos em contato com a assessoria da Amazonas Energia, mas não obtivemos qualquer retorno ou esclarecimento.