SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – As escolas estaduais do Brasil perderam mais de um terço (36%) dos professores efetivos em dez anos. A queda no número de docentes concursados se deve ao aumento da contratação de temporários, que deveriam ser exceção, mas hoje já são a maioria dos que atuam em sala de aula.

Os dados são de um estudo da ONG Todos Pela Educação com informações do Censo Escolar e do Saeb (Sistema de Avaliação da Educação Básica). O levantamento identificou que, enquanto houve a redução de docentes efetivos, o número de temporários cresceu 55% em uma década.

Desde 2022, os docentes temporários se tornaram maioria dos que atuam nas escolas estaduais do Brasil. No ano passado, dos 668 mil professores dessas redes, 356 mil (51,6% do total) tinham contratos temporários.

O estudo também destaca que esse modelo de contratação faz com que os professores atuem condições mais precárias, o que, consequentemente, prejudica o desempenho escolar dos alunos.

“A contratação de professores temporários é importante para garantir que os alunos tenham aula em todas as disciplinas, quando houver faltas ou afastamento dos concursados. Mas o que deveria ser uma exceção se tornou o mais frequente nas redes de ensino por ser mais barato para os estados”, diz Ivan Gontijo, gerente de políticas educacionais do Todos Pela Educação.

Segundo a lei do Plano Nacional de Educacional, as redes de ensino deveriam ter cerca de 10% dos quadro de professores contratados de forma temporária para atuar nos casos de afastamento dos efetivos. No entanto, os dados do Censo mostram que 15 das 27 unidades da federação já trabalham mais com temporários do que concursados -em Minas Gerais, por exemplo, eles são 80% dos docentes que atuam em sala de aula.

As redes estaduais são responsáveis por 30% das matrículas da educação básica do país. No ensino médio, etapa com piores indicadores de qualidade no Brasil, elas concentram 83,6% dos estudantes.

A contratação de temporários foi uma saída encontrada pelos governos estaduais para evitar maior gasto com servidores e com previdência. “Estados com mais problemas fiscais são os que mais têm recorrido a esse tipo de contratação”, diz Gontijo.

O estudo identificou que, em média, os governos têm feito um concurso público para docente a cada seis anos. Assim, eles têm mais professores efetivos se aposentando e os repõem com temporários, com os quais não precisarão lidar com a Previdência.

“Há ainda casos de gestores que preferem fazer contratos temporários por acreditar que são docentes menos suscetíveis a fazer greve e que vão se empenhar mais em apresentar bons resultados por medo de ter o contrato rescindido.”

Os dados mostram ainda que esse tipo de contratação não tem sido usada apenas para suprir uma demanda pontual, mas para de fato compor o corpo docente fixo das redes. O estudo identificou que quase metade (43,6%) dos temporários atua há pelo menos 11 anos como professor.

“São profissionais que estão há anos trabalhando nas escolas públicas, mas com condições piores do que a dos efetivos. Eles têm salários menores, não têm plano de carreira, costumam trabalhar em mais escolas e com mais turmas para preencher o horário, muitas vezes não têm direito a plano de saúde ou gratificações.”

O estudo identificou ainda que, em 15 estados, o salário dos temporários é menor do que o dos efetivos, alcançando uma diferença de até 140%.

Como as condições de trabalho dos temporários são mais precárias, os alunos que têm aula com esses professores acabam tendo piores resultados educacionais. O estudo comparou as notas dos alunos do 9º ano do ensino fundamental e do 3º ano do ensino médio de acordo com o tipo de contratação dos professores.

Nas duas séries, os alunos tiveram desempenho menor quando tiveram aula com professores temporários. “Isso é um reflexo das más condições de trabalho. Os docentes têm uma carga excessiva de trabalho e não conseguem criar vínculo com os estudantes”, diz Gontijo.

Uma das estratégias avaliadas pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para enfrentar o alto número de temporários na educação básica é a elaboração de um concurso nacional e unificado para docentes.

“Essa seria uma estratégia eficiente para ter concursos com mais frequência, já que os estados não precisariam organizar os processos seletivos. Seria uma forma também de qualificar a seleção no país todo”, defende Gontijo.