Em tempos de crise financeira e inflação elevada, pagar as contas em dia ficou ainda mais difícil para diversos brasileiros que convivem com o orçamento apertado. Segundo o Mapa da Inadimplência 2021, o endividamento atinge mais de 63 milhões de consumidores no país. Mas o que acontece com as dívidas após cinco anos? Os débitos podem deixar de existir? Para tirar as dúvidas, O DIA conversou com especialistas que explicaram como funciona o processo.
Vale ressaltar que as pendências financeiras têm prazos, que variam de acordo com o tipo de dívida, para serem cobradas judicialmente. Portanto, quando ocorre a perda da data limite para o credor exigir o pagamento de um débito por vias judiciais, a dívida prescreve. No entanto, ela não deixa de existir após determinado período. Na prática, significa que o valor devido ainda poderá ser solicitado ao inadimplente.
Isso porque o débito pode continuar sendo cobrado extrajudicialmente, por outros meios, como o protesto em cartório, o que impacta automaticamente na análise de score (pontuação de crédito), que avalia o comportamento do consumidor e define uma nota nos bureaus de crédito (SPC, Serasa, Boa Vista, entre outros). As pontuações baixas dificultam o acesso a financiamentos e empréstimos, afetando a reputação dos CPFs.
Foi o que explicou Mellissa Penteado, CEO da proScore, bureau de crédito e authority de Score. A especialista reforçou que as dívidas não desaparecem, continuam existindo e podem, inclusive, continuar sendo cobradas extrajudicialmente. Usualmente, em datas próximas à prescrição, títulos executáveis são abertos em cartório, em cima das faturas vencidas, mantendo o débito no perfil do consumidor e, consequentemente, impactando o score.
“É uma estratégia pouco divulgada, mas é comum entre os credores para impedir que os devedores voltem a ficar com o nome limpo. Ou seja, se antes a pessoa estava com o CPF comprometido por uma negativação, depois ela passa a ficar anotada nos bureaus de crédito com um protesto. O título é protestado em cartório como meio de execução de cobrança, permanecendo ativo por mais cinco anos. Usualmente, passados dois anos, dois anos e meio que a empresa não consegue recuperar a dívida, um protesto já é aberto”, esclareceu a executiva.
De acordo com o artigo 206 do Código Civil, a maioria das dívidas, como débitos com cartões de crédito, convênios médicos, financiamentos e impostos prescrevem em cinco anos. Já contas como água, luz, telefone, internet e gás, por exemplo, têm um prazo maior para prescrever: dez anos. Existem, no entanto, algumas exceções no tempo de prescrição de dívidas, como por exemplo, os débitos contra seguradoras, serviços de hospedagem e cobrança de credores contra sócios e acionistas, que prescrevem em um ano.
Já as dívidas de pensão alimentícia contam com um período um pouco maior: dois anos. As pendências financeiras de aluguel, reparação civil, pretensão de ressarcimento de enriquecimento sem causa, restituição de lucros e dividendos recebidos de má-fé, pretensão contra fundadores, administradores ou liquidantes por violação da lei ou estatuto e pretensão para pagamento de título de crédito vão até três anos.
O requerimento de indenização por parte dos tutelados aos seus tutores prescreve em quatro anos a partir da aprovação de contas. Já o período de cobrança de honorários por parte dos profissionais liberais vai até cinco anos, considerando o início da contagem o momento imediatamente seguinte à conclusão do serviço, do fim dos contratos ou mandato.
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“Quando que uma dívida prescreve? Uma vez que ela é executável, ela é válida. Por vinte anos não prescreve. A não ser que a pessoa faleça, afinal, a dívida não é hereditária. Se eu tenho um inquilino e não cobro a dívida, por três anos, não posso entrar com um processo porque o direito de cobrar judicialmente prescreveu. Isso judicialmente, porque a cobrança extrajudicial pode continuar”, afirmou a CEO da proScore.
Segundo a especialista, há também um outro movimento que pode ser adotado pelos credores, já com o título da dívida no cartório. Para o terreno da cobrança, as empresas podem, simultaneamente ao protesto, após dois anos, abrir um processo judicial. Considerando alguns prazos de títulos de execução de pagamento, a ação pode ser aberta em até cinco anos.
“Nesse caso, elas acabam tendo uma maior amplitude da cobrança, em diferentes instâncias, cada um com o seu respectivo prazo. Se o processo judicial de cobrança for iniciado dentro do prazo de indicação daquele título, você terá um processo que pode ficar ativo por até vinte anos”, concluiu Mellissa Penteado. Diferença entre dívida caduca e prescrita A advogada Patricia dos Santos Rosa, fundadora do escritório Patricia Santos Advocacia, com especialização em Direito Empresarial e Direito Sucessório, explicou que existe diferença entre caducar e prescrever. De acordo com ela, muitas pessoas usam esses dois termos como sinônimos, mas, na verdade, são recursos legais diferentes. Entenda:
“A prescrição da dívida se dá quando a instituição credora emite o comunicado de pagamento (cobrança) e o devedor não o faz, permanecendo inadimplente. Dessa forma, a dívida ainda existe após o prazo legal, porém, poderá ser cobrada apenas de maneira administrativa”, esclareceu Patricia.
“Uma dívida caduca quando dentro de prazo legal – cinco anos para contratos em geral – a instituição credora não emite nenhum tipo de comunicado de pagamento. Nesse caso, a dívida deixa de existir e deve ser retirada dos órgãos de proteção ao crédito”, indicou a especialista em Direito Empresarial e Direito Sucessório.
Como sair do vermelho
Especialista em finanças e planejador financeiro, Marlon Glaciano afirmou que o passo mais importante para se livrar das dívidas será fazer um “check up financeiro” do seu cenário atual. “Faça uma lista simples com todas as suas despesas, o valor de cada uma delas e as classifique como ‘obrigatórias’ e ‘não obrigatórias’. Comece o corte pelas despesas não obrigatórias”, explicou, acrescentando que, para débitos de longo prazo que possuem juros altos, o ideal seria procurar o credor e buscar um acordo.
A educadora financeira Aline Soaper, idealizadora do Instituto Soaper, orientou que uma boa opção seria negociar a quitação do débito com um bom desconto, “mesmo que esteja próximo dos cinco anos para o registro da dívida sair da lista de restrição ao crédito”. Ela deu mais uma dica: “Fazer um planejamento financeiro baseado na realidade e possibilidades pessoais, ajustando o padrão de vida para sobrar dinheiro, criar novas fontes de renda e formar uma reserva financeira para negociar a quitação dessas dívidas à vista, é o melhor caminho”, finalizou Aline.
Para manter as finanças em dia depois de sair do vermelho, o consumidor deve, principalmente, fugir de novas pendências. Nesses casos, o planejamento financeiro funciona como um aliado, já que ajuda a criar uma espécie de rota a ser seguida. “Desta forma, ficará mais fácil evitar débitos desnecessários já que existe um compromisso a seguir. Quem não sabe onde quer chegar acaba comprando o que não precisa”, concluiu o especialista Marlon Glaciano.