Fotos - Aguilar Abecassis

Em um calor tão extenuante quanto o de Manaus em setembro, no imenso deserto do Atacama, no Chile, uma montanha chama atenção e sua imagem viralizou no mundo. São sapatos, camisetas, vestidos, calças e até luvas abandonadas no deserto, resultado da roupa descartada nos Estados Unidos, Europa e Ásia, enviada ao Chile para ser revendida.

Não vendidas, as mais de 40 toneladas importadas acabam no lixo. Na contramão deste cenário, o “#SouManaus Passo a Paço 2023”, realizado pela Prefeitura de Manaus, conta com um espaço destinado à capacitação e à qualificação profissional de artistas, agentes e produtores culturais da capital amazonense ligados à moda. E mais do que ligados às tendências fashionistas, a preocupação deles, compartilhada com todos que circulam pelo espaço no festival, é de falar e praticar a sustentabilidade. Praticar o “lavou tá novo”!

Para a brechoeira Nadir Rocha, 34, uma das pioneiras com brechós na capital (o PJ Brechó, de Petrópolis), o SouManaus é um evento muito aguardado, principalmente, por jovens de classe mais baixa, para ter produtos de qualidade com preços mais acessíveis. “Tem muita gente que não tem condição de comprar uma roupa nova. Tem gente que segura um salário para comprar algo bom. E o melhor de tudo é a sustentabilidade que gira em torno. Roupa não é descartável, você usa uma vez, lavou e está novo. O dia da feira é quando fazemos o nosso marketing e aqui não é só um dia. Vamos gerar clientes por um ano, dois anos. São famílias e jovens que nos procuram querendo algo bom, com preço bom”, comentou.

‘Vestindo o Amanhã’

A diretora do Programa Municipal de Formação Artístico Cultural (Promfac), Karoliny de Oliveira, da Fundação Municipal de Cultura, Turismo e Eventos (Manauscult), contou que o espaço de moda circular e sustentável foi ampliado nesta edição, abrindo o leque de ações e negócios em torno deste mercado.

“É de extrema importância o espaço, porque estamos na Amazônia. Todos os olhos estão aqui, e nada melhor do que nós mesmos cuidarmos de onde vivemos. O desfile ‘Vestindo o Amanhã’ apresentou essa proposta da moda ética, em primeiro lugar. É se perguntar de onde vem a minha roupa, quem fez a minha roupa. Essa pessoa está em algum tipo de trabalho escravo? É a moda consciente, o consumo consciente, o consumo sustentável”, destacou Karoliny.

O espaço pode ser conferido ao lado do estacionamento lateral, atrás do Museu da Cidade, o Paço Municipal, contando ainda com intervenções artísticas como uma máquina de lavar “cuspindo” roupas, com um manequim engolido pelo excesso de produção de vestuário global. Redes de pesca fazem a composição do cenário, com mais peças penduradas, simbolizando o descarte que ainda prejudica o meio ambiente.

“Todo o conceito do espaço foi pensado nisso, de passar essa mensagem para a grande massa entender o que eu estou fazendo com o meu consumo desenfreado, o que eu estou causando com o mundo. O mercado da moda é o segundo mais poluente no mundo e é isso que estamos remetendo aqui, com peças que seriam descartadas, mas que se transformaram em arte pelos alunos do programa”, finalizou a diretora do Promfac.

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Texto – Cláudia do Valle