As emissões de metano de 15 empresas do setor de carne e laticínio representam somam cerca de 12,8 milhões de toneladas e equivalem a mais de 80% de toda a pegada deixada pela União Europeia e mais do que países inteiros, como Rússia, Alemanha, Canadá ou Austrália.
O dado foi divulgado em novembro no relatório “Emissões impossível: Como a indústria de carne e laticínios está aquecendo o planeta”, pelo Institute for Agriculture and Trade Policy (IATP) e a Changing Markets Foundation.
As brasileiras JBS e Marfrig aparecem no topo da lista —tanto de emissões de metano (CH4), quanto de CO2 equivalente, que, além do metano, inclui os gases de efeito estufa CO2 e óxido nitroso.
“Apenas uma empresa de carnes, a JBS, é responsável por quase 40% das emissões pecuárias estimadas por essas corporações. Suas 287,9 milhões de toneladas de emissões de CO2 equivalente superam as emissões da Espanha”, diz trecho do documento.
“Suas emissões de metano [da JBS] excedem as emissões combinadas de metano na pecuária da França, Alemanha, Canadá e Nova Zelândia, e se comparam a 55% do metano na pecuária dos EUA.”
Quanto à Marfrig, a segunda maior produtora de carne bovina do mundo, o documento aponta que as emissões de metano da empresa estão no mesmo nível das provenientes da pecuária na Austrália.
Emissões de metano (kg CH4) de cada empresa
- JBS (sede Brasil) – 4.793.839.720
- Marfrig (sede Brasil) – 1.881.892.248
- Tyson (sede EUA) – 1.572.725.034
- Dairy Farmers of America (sede EUA) – 990.078.641
- Groupe Lactalis (sede França) – 516.891.224
- Fonterra CO (sede Nova Zelândia) – 494.643.030
- Yili Group (sede China) – 417.022.965
- Saputo (sede Canadá) – 392.985.061
- Arla Foods (sede Dinamarca) – 326.332.247
- Nestlé (sede Suíça) – 323.950.260
- FrieslandCampina (sede Holanda) – 281.074.490
- DW Group (sede China) – 261.372.039
- Danone (sede França) – 232.473.624
- DMK Group (sede Alemanha) – 157.211.156
- Danish Crown (sede Dinamarca) – 147.359.890
Se essas empresas fossem uma nação, esta seria a décima maior emissora de gases de efeito estufa do planeta, aponta o relatório. Em nota, tanto a Marfrig quanto a JBS afirmaram que têm metas de redução das emissões de gases de efeito estufa com base na ciência.
A JBS afirmou que está comprometida em atingir emissões líquidas zero de gases de efeito estufa até 2040. “Não vimos o relatório ou a metodologia que essas organizações de defesa de campanha podem ter usado para calcular as emissões. No entanto, quaisquer cálculos feitos sem o benefício de dados completos e precisos são meramente especulativos”, diz a nota.
A Marfrig afirmou que pretende diminuir as emissões de gases do efeito estufa da parte industrial da produção (que envolve transformar a matéria prima em produto e a energia utilizada na planta de suas indústrias) em 68% (ano-base 2019) até o ano de 2035, e que utilizará somente energia renovável até 2030.
Papel do metano no aquecimento
O metano é apontado como peça-chave para conter as mudanças climáticas, uma vez que é cerca de 80% mais potente ao aquecimento da Terra do que o CO2. O Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC) estima que o gás seja responsável por 30% do aquecimento global desde os tempos pré-industriais.
Cerca de 100 países de comprometeram na Conferência do Clima de Glasgow, no ano passado, a reduzir em 30% as emissões de metano até 2030. Na COP27, o número de signatários subiu para 150 países, mas a China, um dos maiores poluidores climáticos, ficou de fora. O Brasil é um dos signatários.
Gás do boi?
Gás de vida curta, porém de efeitos persistentes, o metano é produzido no aparelho digestivo do gado, em processos naturais e em uma série de atividades humanas, como os resíduos de aterros e a produção de óleo e gás.
Tasso Azevedo, coordenador do MapBiomas, explica que as emissões do setor pecuário no mundo estão ligadas à fermentação entérica do boi, mas também à desmatamento associado à expansão das pastagens degradadas. “Com destaque de 54% no caso do Brasil”, diz.
Dados de 2021 do MapBiomas mostram que mais de 98% do desmatamento no país é causado pela agropecuária.
Leis urgentes e ambiciosas
O documento faz recomendações aos governos e pede que os países adotem uma legislação “urgente e ambiciosa para abordar os impactos climáticos significativos das corporações globais de carne e laticínios”, e que “apoiem uma transição justa para a transformação da pecuária industrial em agroecologia”.
O relatório também recomenda às empresas analisadas que estabeleçam “metas separadas de redução de metano e planos de ação para alcançá-las, incluindo relatórios separados de emissões de metano”.
Antes que a carne seja apontada como vilã do clima, os especialistas afirmaram à DW que é possível promover uma pecuária de baixo impacto climático com as seguintes medidas:
- Recuperar pastagens degradadas. O solo recuperado remove o carbono da atmosfera e ainda melhora o alimento do gado. Com alimentação em pastos saudáveis, é possível reduzir a emissão de metano da fermentação entérica;
- Incluir aditivos na alimentação do gado que inibem a produção de metano durante a digestão;
- Reduzir o tempo de abate do animal para reduzir a sua permanência no pasto;
- Melhorar a qualidade das pastagens para aumentar o número de cabeças de gado por hectare;
- Investir em sistemas integrados de pastagens, promovendo a integração lavoura-pecuária-floresta.
Renata Potenza, coordenadora de projetos de Clima e Cadeias Agropecuárias no Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora), diz que o Brasil tem oportunidade de reduzir as emissões da pecuária e ainda sequestrar carbono por meio de solos recuperados. “Temos tecnologia disponível, mas falta assistência técnica para o produtor.
Precisamos focar na transferência de tecnologia para o campo, para quem produz a carne”, afirma. (Com DW)
com informações do UOL Notícias*