Juristas ouvidos pelo GLOBO avaliam que a determinação do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Kassio Nunes Marques, que suspendeu a cassação do deputado estadual bolsonarista Fernando Francischini (União Brasil-PR), não impede eventuais punições a candidatos por fake news sobre as urnas eletrônicas e o processo eleitoral nas eleições de outubro. O julgamento de Francischini foi o primeiro em que houve condenação de um parlamentar por fake news na História do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e era considerado um parâmetro para casos parecidos.
Na decisão favorável a Francischini, o ministro Nunes Marques se posicionou contra, entre outras pontos, à decisão do TSE de aplicar às redes sociais as mesmas regras previstas para uso indevido dos meios de comunicação, ponto trazido pela defesa. O magistrado também entendeu que faltam elementos que comprovem o comprometimento da disputa eleitoral em decorrência da live do deputado, feita em 2018, na qual afirmou, sem provas, que as urnas eletrônicas estavam fraudadas para impedir a eleição de Jair Bolsonaro.
Coordenador da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep), o advogado Luiz Fernando Casagrande Pereira lembra que, na decisão do TSE que rejeitou a cassação da chapa Bolsonaro-Mourão, a Corte fixou a tese de que disparos em massa com desinformação podem configurar abuso de poder econômico e uso indevido dos meios de comunicação social e que a própria resolução da Corte que normatiza a propaganda eleitoral nas eleições de 2022, aprovada por unanimidade em dezembro do ano passado, veda a divulgação de “fatos sabidamente inverídicos ou gravemente descontextualizados” que atinjam a integridade do processo eleitoral, incluindo processos de votação, apuração e totalização de votos.
“O TSE explicitou a possibilidade para que candidatos sejam cassados por fake news. A decisão de Nunes não afasta esse entendimento, mas reforça que a fake news deve ter impacto no pleito para uma eventual cassação”, afirma Pereira.
A advogada eleitoral Samara Castro, do Observatório das Eleições da OAB do Rio e também membro da Abradep, ressalta que a resolução do TSE tem força normativa. O texto da norma prevê que a Justiça Eleitoral, a partir de requerimento do Ministério Público, determine que um conteúdo desinformativo sobre o processo eleitoral seja retirado do ar e apure a responsabilização penal, abuso de poder e uso indevido dos meios de comunicação.
“Ainda temos o entendimento da resolução e a Corte Eleitoral coletivamente entendeu assim”, ressalta a advogada.
Já o professor de Direito Michael Mohallem, da PUC-Rio, avalia que o TSE e tribunais regionais ainda podem ter entendimento semelhante ao da decisão que havia cassado Francischini em novas ações, mas que, se a determinação de Kassio Nunes não for revista, a ação contra Francischini deixará de ser um modelo não apenas em casos de cassação de mandato, mas também em pedidos de suspensão de propaganda ou candidatura por fake news sobre o processo eleitoral.
“É menos problemático para o caso passado, do deputado, e mais para os efeitos futuros, nas eleições de 2022. Há preocupação porque a decisão suspende o precedente criado pelo TSE. Isso não significa que ministros e juízes de tribunais regionais em um caso parecido não possam tomar a mesma decisão, mas que deixam de aplicar uma decisão baseada num precedente que fortalece a tese”, conclui Mohallem.
Fonte: O Globo