Aliados aconselharam o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a dar uma trégua nas críticas à taxa de juros, ao BC (Banco Central) e ao chefe da autarquia, Roberto Campos Neto. Eles defendem que as críticas, a partir de agora, fiquem restritas a determinados integrantes do partido e, especialmente, parlamentares.
De acordo com relatos feitos à reportagem, o presidente vinha sendo aconselhado por seus auxiliares mais próximos a evitar fazer críticas diretas a Campos Neto. Apesar de concordarem com a objeção ao patamar dos juros, a visão expressa ao chefe do Executivo é que não precisaria ser ele o responsável por esse papel –até mesmo porque seus ataques acabavam dando importância maior ao presidente da autoridade monetária.
O conselho foi seguido já no fim da semana passada, quando Lula foi a Washington encontrar o presidente Joe Biden e, mesmo questionado por jornalistas brasileiros sobre taxa de juros, não comentou. A agenda ficou restrita à defesa da democracia e de laços comerciais com os Estados Unidos.
Além disso, nos três discursos que fez nesta semana, no ato de aniversário do PT, na retomada do Minha Casa, Minha Vida e de obras no Nordeste, ele não citou o principal alvo de suas falas públicas anteriores.
Em todos, fez um discurso em que mencionou o combate à fome ou a retomada do crescimento. Durante a entrega de residências em Santo Amaro (BA), disse que “a roda-gigante do país começa a girar hoje”.
Outro ponto em comum nas falas foi o ajuste do alvo para Jair Bolsonaro (PL), seu adversário político. O mandatário disse que o ex-presidente não entregou a faixa e disse que vai tirar bolsonaristas “escondidos às pencas” no governo.
“Vou lutar pelo nosso partido e vamos lutar pelo povo brasileiro, para que nunca mais um genocida ganhe eleições com base na mentira e na indústria da mentira”, disse Lula, na noite de segunda-feira (13), durante o evento do PT.
Antes mesmo da entrevista de Campos Neto ao Roda Viva, da TV Cultura, quando o chefe da autarquia fez acenos ao governo, Lula já havia deixado de falar sobre o assunto. No evento de aniversário do PT na noite de segunda-feira (15), as críticas ficaram restritas à presidente do partido, Gleisi Hoffmann.
“Está na hora de enfrentarmos esse discurso mercadocrata dos ricos desse país, que temos risco fiscal. Qual risco? De não pagar a dívida? Mentira. Nossa dívida é toda em reais, numa proporção razoável do PIB. Ainda temos as reservas internacionais, deixadas pelo PT”, afirmou Gleisi.
“Eles mentem, e o Banco Central, uma autarquia do Estado brasileiro corrobora com a mentira, impondo um arrocho de juros elevados ao Brasil. Isso tem que mudar”, complementou.
Em paralelo a isso, deputados governistas lançaram, na terça-feira (14), uma Frente Parlamentar de Combate aos Juros Abusivos.
“Por entender que a questão dos juros altos é central para a economia brasileira e para a geração de empregos é que estamos lançando a Frente Parlamentar Contra os Juros Abusivos na Câmara dos Deputados para mobilizar parlamentares e a sociedade sobre o tema”, disse o líder do PT na Câmara, Zeca Dirceu (PR).
Ao Roda Viva, por outro lado, o chefe da autoridade monetária mostrou disposição com o governo e falou que fará tudo o que estiver ao seu alcance para aproximar o BC da gestão petista. Apesar disso, discordou de uma mudança nas metas de inflação.
“Se a gente fizer uma mudança agora, sem um ambiente de tranquilidade e um ambiente onde a gente está atingindo a meta com facilidade, o que vai acontecer é que você vai ter um efeito contrário ao desejado. Ao invés de ganhar flexibilidade, você pode terminar perdendo flexibilidade”, afirmou Campos Neto.
O presidente do BC voltou a acenar ao governo dois dias depois, nesta quarta-feira (15), durante sessão solene no Congresso Nacional. Disse que é preciso ter um “olho mais especial no social”.
Lula vinha intensificando as críticas ao BC desde que a instituição manteve a taxa básica (Selic) em 13,75% ao ano e indicou que pode sustentar os juros elevados por mais tempo.
O foco inicial dos ataques de Lula era a autonomia do BC, a qual chamou de “bobagem”. A retórica depois evoluiu para ataques diretos a Campos Neto.
Aos olhos do chefe do Executivo, o presidente da autarquia passou de “economista competente” às vésperas das eleições a “esse cidadão” ao final do primeiro mês de governo.