Ira compartilha diariamente com cerca de seus quase 48 mil seguidores o seu dia a dia entre a natureza rica da sua aldeia e sua vida agitada da “cidade grande”
O mundo dos influencers tem se tornado cada dia mais reconhecido por todos os que navegam pelas redes sociais, especialmente no instagram e tik tok. Já são 4,7 bilhões de usuários ativos nas redes sociais, o que representa 59% da população mundial. Lá você encontra dicas de beleza, viagens, rotina de alimentação fitness e muito mais, mas há também novidades que tem se tornado o diferencial de representatividade e cultura que é o caso da influencer e modelo indígena Ira Maragua.
Ira é uma jovem da Etnia Baré do município de São Gabriel da Cachoeira-Am, conhecida como a capital estadual dos povos indígenas, no município se fala oficialmente quatro idiomas: Nheengatu, Tukano, Baniwa e o Português. A jovem Baré começou a gravar vídeos em 2018 aos 20 anos inspirada em outras influencers, mas sentia falta de uma representante do seu povo. Ira relata ainda a dificuldade que sentiu em gravar com seu sotaque.
“Comecei a gravar mesmo em 2018, quando eu tinha 20 anos. Treinava muito em frente aos espelhos, me inspirei em outras influenciadoras, mas via que na internet faltava alguém para representar o meu povo, eu pesquisava sobre a minha cultura e não tinha nada sobre o assunto. Gravei mostrando um pouco do meu dia a dia, mostrando os rios e as comidas típicas da minha região. As pessoas foram chegando e fui perdendo a vergonha. Eu tinha mais vergonha do meu jeito de falar. Mas deixei a vergonha de lado e gravei sem nenhum medo”.
A influencer, assim como inúmeros indígenas no brasil, sofreu na pele preconceito quando começou a postar seus vídeos. “Algumas palavras me deixavam um um pouquinho decepcionada com as pessoas, como: vocês comem formigas? Isso é nojento! Vocês são índios de verdade ou isso é apenas um papel? Pensei que os índios nem existiam mais! Vocês fazem orgias? Uma indígena fazendo publi? Usando sapato? Eu sempre tento explicar para as pessoas que temos costumes e somos criados de um jeito diferente. Que isso é cultura e tradição. Não é porque temos celulares que deixamos de ser indígenas, estamos aqui para quebrar os estereótipos daqueles indígenas dos livros”.
Quando questionada sobre a importância de ser símbolo de representatividade para milhares de meninas do seu povo, Maragua respondeu que fica muito feliz, em especial em ver que seus vídeos estimulam as meninas a saber mais de suas raízes.
“O meu objetivo nas redes sociais é ser inspiração para as meninas. Eu gosto de ver quando elas procuram saber as suas raízes, quem foram seus avós, de qual povo eles vieram, eu fico feliz quando as seguidoras entram em contato comigo e falam, Ira eu vi a sua cultura e mostrei pra minha mãe, a minha mãe me contou que sou do povo Sateré. O meu objetivo não é só mostrar a beleza e sim mostrar que nós mulheres, mães e adolescentes devemos ocupar um espaço na sociedade, e mostrarmos sim que somos capazes”, diz a indígena.
Influencer digital e modelo, a jovem é embaixadora de grandes marcas conhecidas em nível nacional, e o trabalho a obriga a passar boa parte do tempo longe de sua terra natal e sua família, a modelo relata o desafio que é migrar para a ‘cidade grande’, mas que sempre renova as energias quando regressa.
“Eu vim de um lugar muito calmo, São Gabriel da Cachoeira é um município com um ar diferente, o rio é diferente. Enfrentar a cidade grande foi um desafio, tudo muito longe e o cheiro é diferente e o som também, sempre muito barulhento. Por um instante pensei em desistir, a saudades da família aperta, quando estou no meu limite da cidade grande vou para o meu município, não importa a hora pra me renovar, para viver bem a minha família, às vezes eu penso que sou fraca mais isso é pra nos fortalecer.”
Ainda em entrevista ao Portal Amazônia Press, Ira contou como foi ser musa inspiradora do artista Alessandro Hipz, O artista grafitou a imagem de Ira que é conhecida como “Guardiã da Amazônia” que ilustra o antigo Hotel Amazonas no Centro Histórico de Manaus. A imagem de Ira se tornou uma grande obra de arte exposta a céu aberto, que diariamente ganha o mundo através das lentes de centenas de turistas.
“Pra mim estar em mural feito por um grande artista como o Alessandro Hipz, foi um sinônimo de resistência, vim do município mais indígena do Brasil com 23 etnias, não só representando o meu povo mais sim todas as mulheres guerreira a Kunhã kirimbawa a mulher de luta e de guerra. Um sinônimo de resistência para o meu povo, porque a pintura é uma mulher indígena raiz, com a sua árvore genealógica toda indígena, sem nenhuma mistura”.
A Jovem finaliza expondo o quanto é importante as mulheres não desistirem de ocupar seus espaços em todos os âmbitos sociais. “Chega um tempo em que a mulher não aguenta mais, de tanta pressão da vida, as vezes desistir pode fazer bem, desistir nem sempre é um sinônimo de fraqueza. Você tem que se libertar primeiro para que coisas melhores possam vir, mesmo que não dê certo, respire e continue tentando. Tenham força e ocupem esse espaço por que você mulher maravilhosa nasceu pra brilhar e ocupar o que é seu, nas escolas, hospitais, plenários, nas indústrias ou até mesmo nas redes sociais”. Disse Ira Maragua.
As mulheres indígenas sempre tiveram um papel fundamental na defesa dos territórios, da natureza e da vida dos povos originários. Hoje milhares de “Iras” estão ganhando seus espaços, mas ainda esbarram em muito preconceito, a mulher indigena quer ter oportunidade, quer ter vez e voz, e acima de tudo respeito com seu povo e seus ancestrais.
Por: Karleandria Araújo.