POR RAFA VAISMAN
Como falei no texto da coluna passada , a ONU em 2015 criou os 17 ODS (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) que são um apelo global à ação para acabar com a pobreza, proteger o meio ambiente e o clima e garantir que as pessoas, em todos os lugares, possam desfrutar de paz e de prosperidade.
Decidi trazer aqui hoje uma pessoa que respira as temáticas relacionadas a sustentabilidade, André Palhano, fundador da Virada Sustentável, que este ano chegou a 11ª edição, após nascer em São Paulo e se espalhar por várias cidades do país.
Confira entrevista da coluna Humanos Digitais com André:
Como o Virada Sustentável se adaptou ao modelo digital ou híbrido na edição passada?
– Fizemos uma profunda transformação no festival, que até então concentrava público em massa em locais como parques, praças, escolas e equipamentos culturais. Promovemos grandes instalações, projeções mapeadas, grafites etc. em locais de grande circulação na cidade, com forte impacto midiático e nas redes sociais, mas sem chamar o público diretamente, assumindo mais uma cara de campanha criativa, de ocupação, que invade a cidade levando informação e reflexão, mas sem gerar aglomerações. E deixamos para o online os painéis de discussão e rodas de conversa, que funcionam bem nesse formato, ainda que com os ajustes necessários.
Já que estamos falando de painel online, gostaria de tocar exatamente nesse assunto contigo. Vivemos na fronteira entre dois mundos: nosso ambiente físico e o ciberespaço, que posso chamar de ambiente digital ou meio digital. Esse ciberespaço é o espaço não físico constituído pelas redes digitais, ou espaço virtual onde não é necessário a presença física do ser humano, dando ênfase ao ato da imaginação. Como você abordou a questão da digitalização social no evento do ano passado do Virada Sustentável? Quais paineis abordaram essa relação humano-digital?
– Tivemos uma mudança importante no papel do ambiente digital no próprio evento. Antes as redes eram apenas mais uma mídia para divulgarmos a Virada, chamando o público a comparecer aos eventos presenciais. Nesse novo formato, o digital passou a ser um elemento central em nossa estratégia de impacto e alcance, passando a ser um dos principais ambientes onde contamos as estórias, os debates, as intervenções urbanas, ampliando a cauda longa do festival e levando seus conteúdos para um nível de alcance inimaginável em comparação com o presencial. Sobre eventos que tratem especificamente sobre esse tema, destaco a parceria que temos com o NIC.br, que envolve a promoção de painéis específicos sobre o papel da digitalização no País, sua aplicação em temas como o de cidades inteligentes e, claro, os impactos do abismo ainda existente em quem tem e quem não tem o acesso a esse ambiente, que ficou ainda maior com a pandemia.
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O termo Sustentabilidade 5.0 traz como questão central uma reflexão mais profunda sobre a capacidade do ser humano de evoluir e prosperar em uma sociedade cada dia mais digitalizada. Você já possui opinião formada sobre esse assunto?
– A digitalização pode – e deve – ser uma das ferramentas mais importantes para alcançarmos um modelo de desenvolvimento sustentável de fato, seja pela ampliação do acesso à informação, que gera consciência e discernimento, seja pela aplicação prática em temas como a preparação das cidades para os efeitos das mudanças climáticas, a mobilidade urbana, a inovação tecnológica na produção de alimentos, as redes distribuídas e inteligentes de energia elétrica, entre tantos outros. Acho um pouco ingênua a percepção de que a digitalização nos afastará do ambiente natural ou que daremos menos importância aos temas da sustentabilidade, até porque ela tangibiliza, de certa maneira, um modelo sistêmico que é a base da sustentabilidade e de suas complexas relações.
Sustentabilidade 5.0 também sugere repensar como as organizações vão conseguir descarbonizar ou neutralizar suas economias até 2030-40-50 com o uso de tecnologias e tecnologias digitais. Será possível?
– Acredito que sim, até porque há muito investimento do setor privado (e do setor público em alguns países) nessa direção, seja em pesquisa e desenvolvimento, seja em tecnologias aplicadas. Essa tendência vai ficar ainda mais acelerada com o advento da agenda ESG, que embora não seja exatamente nova, traz o peso de entrar pela porta da Governança no mundo corporativo, com pressão direta dos shareholders, e com a COP que acontece agora em novembro na Escócia.
Quais as principais lições das edições recentes da Virada Sustentável? Quais os próximos passos?
– Talvez o principal aprendizado tenha a ver com o fato de que é possivel, sim, extrapolar o alcance das nossas ações, atrações e conteúdos para além do ambiente físico e do público presencial, utilizando o digital de maneira inteligente e criativa para fazer com que tais reflexões cheguem a um número muito maior de pessoas. E fizemos uma coisa muito interessante esse ano, ao chamar 100 das principais organizações de sociedade civil para que deixassem uma mensagem que toda pessoa deveria ouvir para um mundo pós-pandemia e levando essas mensagens para escadas do metrô, empenas de prédios com projeções mapeadas, grafites gigantes e outros formatos que levassem, de maneira criativa e atraente, tais mensagens para o público geral. Com isso ganhamos não apenas uma enorme representatividade, mas também uma força de alcance e de acesso que só a atuação em rede consegue conquistar. Essa potência não está na Virada Sustentável, está na própria rede, na qual atuamos muito mais como um agregador, um facilitador, com resultados bastante interessantes.
Como pensar SUSTENTABILIDADE sem pensar TRANSFORMAÇÃO DIGITAL?
– Impossível no mundo em que vivemos pensar em um tema sem pensar no outro. Como disse antes, a transformação digital veio para ficar e ela nos ajudará, tenho certeza, a superar os enormes desafios que temos como sociedade, entre os quais destaca-se o de alcançarmos um modelo de desenvolvimento de fato sustentável.