SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A empresa de ônibus acusada de integrar esquema de lavagem de dinheiro da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital) usou laranjas para assinar contratos com ao menos duas prefeituras em São Paulo, segundo investigação do Ministério Público.
Alvo de operação que denunciou 10 diretores e sócios por organização criminosa, lavagem de dinheiro, extorsão e apropriação indébita, a Transwolff, dona da segunda maior frota de ônibus da capital paulista, é apontada pelos promotores como a beneficiária de dois contratos com a Prefeitura de Cananéia, no litoral sul, firmados em 2017 com uma empresa laranja.
Segundo os promotores, a empresa acusada teve contratos suspeitos com a Prefeitura de Iguape, também no litoral sul. A denúncia, porém, não detalha como funcionava o esquema no município.
Os contratos de prestação de serviço de transporte público de Cananéia foram assinados com a empresa Regina Gonçalves Alves- ME, de maneira emergencial e sem licitação, e somaram R$ 663.467,40. Na época, o prefeito era Gabriel Rosa (PSD), que teve o mandato cassado pela Câmara Municipal em setembro de 2020 por desvio de verba em outros contratos.
Segundo o Ministério Público, Regina fazia parte do quadro de funcionários da Transwolff, e trabalhava como motorista de ônibus com salário de 1.918,13.
O acordo com a prefeitura previa repasses mensais de R$ 30 mil para a oferta de duas rotas de transporte de passageiros nos dias de semana. Além disso, as investigações apontaram que a empresa não funcionava no endereço declarado à Junta Comercial.
Uma vez que a contratação foi feita de forma direta, sem participação de outros interessados, o processo incluiu uma pesquisa de preços para comprovar que a proposta escolhida estava de acordo com os preços vigentes. Segundo os promotores, as quatro empresas consultadas pela Prefeitura de Cananéia tinham os mesmos funcionários e eram administradas pela mesma pessoa, Reginaldo Gonçalves da Silva.
Ele foi vice-presidente da Cooperpam, cooperativa que deu origem à empresa Transwolff, na mesma gestão presidida por Luiz Carlos Efigênio Pacheco, o Pandora, preso em operação do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado de São Paulo) no último dia 10 acusado de chefiar o esquema de lavagem de dinheiro do crime organizado por meio da operação de linhas de ônibus na zona sul da capital.
Silva também é sócio-fundador da empresa Transpelicano Transportes e Turismo Eireli, apontada pela Promotoria como a executora do contrato de transporte público em Cananéia.
“Não há dúvidas acerca do conluio dos envolvidos para dar a aparência de concorrência real ao certame, que, a bem da verdade, não existiu”, diz trecho da denúncia da Promotoria de Justiça de Cananéia.
Além disso, o TCE (Tribunal de Contas do Estado) apontou indícios de superfaturamento na formação de preços do contrato.
Um dos contratos foi firmado após uma ação civil pública que exigiu transporte regular para os moradores dos bairros do Ariri e Itapitangui ao centro de Cananéia. O trajeto de três horas e meia era feito apenas três vezes por semana em balsas, já que as localidades são isoladas pelo estuário na divisa do estado com o Paraná.
As informações obtidas pelos promotores foram enviadas ao Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) por conter indícios de cartel e infração à livre concorrência de mercado. “Todas as pessoas físicas e jurídicas citadas apresentam vínculos de clara confusão patrimonial e de unidade de interesses, atuando em simulacro de competição e frustrando o caráter competitivo dos certames, configurando verdadeira organização criminosa baseada na cidade de São Paulo”, diz trecho da denúncia.
A empresa que assinou contratos com a prefeitura da cidade litorânea tinha também envolvimento com Joelson Santos da Silva, diretor da Transwolff e réu no processo que acusa a empresa de envolvimento com o crime organizado.
As prefeituras de Cananéia e Iguape foram procuradas pela reportagem na tarde desta quinta-feira (26) e não retornaram até esta publicação, assim como a empresa Regina Gonçalves Alves- ME. O ex-prefeito Gabriel Rosa também foi abordado, mas não respondeu aos questionamentos.
A reportagem não conseguiu contato com Reginaldo Gonçalves da Silva e com a Transwolff.
Promotores do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado de São Paulo) apontaram em denúncia oferecida no último dia 10 que a Transwolff usou dinheiro do crime organizado em 2015, quando teve um salto no capital social de R$ 1 milhão para R$ 55 milhões para participar de uma licitação municipal.
Na então gestão do prefeito Fernando Haddad (PT), o certame exigia comprovação de capital mínimo de R$ 25 milhões para as empresas se tornarem aptas a concorrer.
Entre 2015 e 2022, após o aporte milionário de uma empresa de fachada, a Transwolff incluiu 397 pessoas como cooperados, “algumas delas indicadas pelo PCC”, que passaram a receber repasses, de acordo com os promotores.